Desacerto em protesto faz time levar 2 gols em ‘modo estátua’ no México
Há histórias que de tão pitorescas acabam sendo incluídas na memória do futebol com ares de folclore, de “acredite se quiser”.
A mais recente aconteceu no México, na sexta (18), no duelo entre Veracruz e Tigres, pelo campeonato nacional.
Lanterna do Mexicano, o Veracruz ia a campo com o desafio de quebrar uma série de 39(!) jogos sem ganhar na competição – uma eternidade.
O último triunfo datava de 28 de agosto de 2018, há quase um ano e dois meses, um magro 1 a 0 contra o Tijuana. Depois, 28 derrotas e 11 empates.
Além do inglório jejum, um agravante: jogadores com os salários atrasados em até seis meses.
A prolongada falta de pagamento motivou os atletas do Veracruz a planejar um protesto diante de seus torcedores, no estádio Luis “Pirata” Fuente, contra o presidente dono do clube, Fidel Kuri Mustieles.
Para isso, contariam com a solidariedade do time visitante, o Tigres, que se propôs a participar do ato.
Além de posarem juntos antes da partida, os jogadores das duas equipes, iniciada a disputa, manter-se-iam estáticos por um tempo, sem nada fazer.
O problema é que houve um desacerto em relação a quantos minutos os dois times se recusariam a jogar bola.
Passado 1 minuto e 20 segundos, o atacante francês Gignac interrompeu o “modo estátua” e correu na direção do goleiro do Veracruz, Sebastián Jurado, que, vendo a aproximação do rival, deu um chutão para a frente.
Enquanto os atletas do Veracruz permaneceram parados, os do Tigres, que brigam na parte de cima da tabela, resolveram jogar.
A bola chegou ao atacante chileno Vargas – que atuou na Copa América deste ano, no Brasil –, que, quase do meio de campo, arriscou um chute a gol. Jurado, sem se mexer na marca do pênalti, foi encoberto. Tigres 1 a 0.
Houve nova saída, e o Veracruz entregou de novo a bola ao Tigres, dando continuidade ao protesto.
Depois de algum tempo tocando a bola, e constatando que os oponentes não dariam mesmo combate, a equipe decidiu ampliar o marcador. Gignac, também de longe, tocou para o gol, mais uma vez contando com a inoperância proposital do goleiro: 2 a 0, com 3 minutos e 23 segundos transcorridos.

Se os jogadores não celebraram, certamente por constrangimento, a pequena torcida do Tigres nas arquibancadas o fez sem se acanhar, faceira e saltitante.
Só depois disso o Veracruz interrompeu a manifestação e o jogo pôde transcorrer normalmente. Com os dois lados em movimento, cada time marcou uma vez, e o confronto terminou 3 a 1.
Depois do apito final, o capitão do Tigres, Guido Pizarro, declarou que havia o acerto prévio para que os jogadores cruzassem os braços por somente um minuto.
Acrescentou que, pouco antes do começo da partida, o capitão do Veracruz, Leobardo García, solicitou que o ato se estendesse por mais tempo, de três a cinco minutos.
Segundo Pizarro, o Tigres não aceitou e, por isso, transcorrido pouco mais de um minuto, deu unilateralmente o protesto por encerrado, passando a jogar “sozinho” e, discussão de fair play à parte (é correto tirar proveito de um adversário que de forma escancarada e anunciada não ofereceria resistência?), fazer gols.
Encerrada a partida, os jogadores do Veracruz aplaudiram ironicamente os do Tigres, em clara desaprovação ao comportamento adotado.
No fim das contas, esses gols sofridos durante o “modo estátua” foram o que chamou mais a atenção de todos, servindo para que a insatisfação dos jogadores do Veracruz com a situação de penúria por que passam repercutisse amplamente.
Sem uma solução para as pendências salariais, Fidel Kuri, o presidente do Veracruz, limitou-se a dizer que estava “envergonhado pelos torcedores” e que “uma vez mais fomos a piada da nação”.
A esperança para os desesperançosos sem-salário vem da Federação Mexicana de Futebol (FMX), que anunciou a criação de um fundo emergencial de US$ 1 milhão (R$ 4,13 milhões) destinado a jogadores que comprovarem que estão em situação calamitosa.
Até a data desse distintíssimo jogo, de acordo com a FMX, apenas dois atletas do Veracruz fizeram reclamação oficial acerca de salários não pagos.
Em tempo: Neste ano o México já teve pelo menos mais uma situação inusitada. Cobrado pela torcida devido ao desempenho ruim do Puebla, o meia Pablo González prometeu que o time pagaria uma cerveja a cada torcedor que fosse ao estádio no caso de a equipe não derrotar o Juárez. Por muito pouco González não se viu envolto em um prejuízo estimado em R$ 120 mil. O gol da vitória por 2 a 1 só saiu aos 46 minutos e meio do segundo tempo, nos acréscimos.