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Quem é Van Dijk, eleito o melhor jogador da Europa

O holandês Virgil van Dijk foi eleito, aos 28 anos, o melhor jogador da Europa na temporada 2018/2019.

Trata-se de uma conquista rara para um jogador de sua posição: zagueiro.

Desde 1998, quando a Uefa (entidade que controla o futebol europeu) criou a premiação, é a primeira vez que um beque ganha o troféu.

Atualmente, o colégio eleitoral é formado por 80 treinadores – os dos clubes que participaram da fase de grupos da Champions League e da Liga Europa – e 55 jornalistas, um de cada uma das federações do continente.

Levando-se em conta os prêmios entregues historicamente por Fifa ao principal destaque de cada ano (“Melhor do Mundo”, atual “The Best”, desde 1991) e revista France Football (“Bola de Ouro”, desde 1956), só em quatro ocasiões um zagueiro ficou em primeiro lugar: os alemães Franz Beckenbauer (1972 e 1976) e Mathias Sammer (1996, na eleição da Fifa), e o italiano Fabio Cannavaro (2006).

Van Dijk (pronuncia-se van dêic), que joga pelo Liverpool, obteve 305 pontos e superou duas lendas vivas do futebol, ambos atacantes e artilheiros, o argentino Messi (207 pontos), do Barcelona, e o português Cristiano Ronaldo (74 pontos), da Juventus.

O prêmio lhe foi entregue nesta quinta (29), em cerimônia no Principado de Mônaco.

Van Dijk posa com o prêmio de melhor jogador da Europa na cerimônia da Uefa no Grimaldi Forum, em Mônaco (Eric Gaillard – 29.ago.2019/Reuters)

Hoje uma estrela, Van Dijk demorou bastante para chegar a esse status, que pode ser considerado recente, de um ano e meio para cá.

Quando tinha 17 anos, idade em que muitos atletas são disputados por clubes de ponta, era incerto se ele seguiria a carreira futebolística.

Dividia os treinos nas categorias de base do Willem II, time da cidade de Tilburg, com a função de ajudante de cozinha em um restaurante de Breda, onde nasceu e cresceu.

Ia de bicicleta para o município vizinho e do mesmo modo regressava, meia hora na ida, meia hora na volta. No trabalho no Oncle Jean, lavava pratos.

O excesso de tranquilidade de Van Dijk, hoje uma de suas principais qualidades, era visto como defeito – não no restaurante, mas nos gramados. Olheiros o consideravam meio desligadão durante parte dos jogos.

Tanto que não despertou a atenção de nenhum dos grandes da Holanda (Ajax, PSV e Feyenoord).

Dispensado pelo Willem II e sem chance no clube de sua cidade, o NAC, restou-lhe o Groningen, a mais de 200 km de distância de Breda. Foi levado para lá em 2011, aos 18 anos, pelo olheiro Henk Veldmate, que hoje presta serviços ao Ajax.

O começo foi dificílimo, quase trágico. No primeiro ano no time, teve uma apendicite aguda, uma peritonite (inflamação da membrana que reveste o abdômen) e uma infecção no rim.

Nem ele nem o clube perceberam a gravidade do quadro clínico. Quem o fez foi sua mãe, Hellen, que durante uma visita o levou a um hospital para exames detalhados.

Internado, Van Dijk passou por cirurgia e demorou a se recuperar. Em entrevista depois que recebeu alta, revelou que jamais sentira tanto medo e que temeu a morte.

“Ainda me lembro de padecer naquela cama. A única coisa que eu via eram tubos saindo de mim. Meu corpo estava detonado e eu não conseguia fazer nada. Naquela hora, os piores cenários passaram pela minha cabeça. Minha vida corria risco, e até assinei alguns papéis, uma espécie de testamento. Se eu morresse, uma parte do meu dinheiro iria para minha mãe.”

Hellen é separada do pai, Ron, de quem o atleta guarda desgosto e rancor. Tanto que, na camisa, o nome que ele sempre pede para ser inscrito é “Virgil”, e não “Van Dijk”.

Virgil, como Van Dijk prefere ser chamado, em Liverpool x Arsenal na Premier League (Phil Noble – 24.ago.2019/Reuters)

Van Dijk aos poucos recuperou-se do baque na saúde e passou a jogar regularmente, e bem. Seu desempenho resultou em chance na seleção sub-21 da Holanda.

E, de acordo com Rob Maaskant, que treinava o zagueiro no Groningen, uma derrota por 3 a 0 para a Itália, na qual Van Dijk jogou uma rara partida ruim, determinou definitivamente o desinteresse dos principais clubes holandeses nele.

“Você olha para trás e pergunta: ‘Onde você vai ser avaliado?’. E esses são os jogos em que todas as pessoas estão. Três a zero simplesmente não cai bem no currículo”, disse Maaskant ao jornal Irish Independent.

Havia um olheiro, contudo, que tinha o pressentimento de que o grandalhão de 1,93 m e 92 kg um dia seria não apenas um dos melhores do mundo em sua posição mas também um líder.

John Park trabalhava para o Celtic, da Escócia. O clube aceitou a recomendação e pagou ao Groningen perto de € 3 milhões por ele.

No gigante escocês (tem 50 títulos nacionais, atrás apenas do arquirrival Rangers, com 54), Van Dijk atuou em 115 partidas de 2013 a 2015.

Nas duas temporadas completas em que lá esteve (2013/2014 e 2014/2015), foi eleito para a seleção do campeonato. Nelas, o Celtic ganhou o Campeonato Escocês. Faturou também a Copa da Escócia de 2015.

A transferência para a vizinha Inglaterra, dona do mais badalado e rico campeonato nacional do planeta, a Premier League, contou com a anuência de um dos melhores zagueiros que a Holanda já teve.

Ronald Koeman, campeão europeu por seu país em 1988 e ídolo do Barcelona na primeira metade dos anos 1990, treinava o Southampton e deu o aval para a contratação do compatriota. O clube, de força esportiva mediana, pagou € 3 milhões ao Celtic.

Na temporada 2015/2016, Van Dijk, formando uma sólida a zaga com José Fonte (que viria a ganhar a Eurocopa de 2016 com Portugal), ajudou o Southampton a terminar a Premier League na sexta colocação, a melhor em 31 anos.

A partir daquele momento, o Liverpool passou a ter interesse nele e iniciou um namoro que levou um ano e meio para virar casamento. O interesse era recíproco, pois Van Dijk ansiava por disputar a Champions League, só que o Southampton relutava em se divorciar do jogador, com quem tinha contrato até 2022.

O negócio só se formalizou no fim de 2017, depois que o Liverpool aceitou pagar € 84,5 milhões para fazer de Van Dijk o mais caro zagueiro da história – no mês passado, esse posto passou a pertencer ao inglês Harry Maguire, por quem o Manchester United pagou ao Leicester € 87 milhões (R$ 397 milhões).

O resto é história recente, e o sucesso do atleta é conhecido por quem acompanha o futebol europeu.

Van Dijk foi escolhido pela Associação dos Atletas Profissionais da Inglaterra o futebolista do ano na temporada 2018/2019 (Reprodução/Instagram de Virgil van Dijk)

Sob o comando do técnico alemão Jürgen Klopp, Van Dijk causou impacto imediato em uma defesa considerada pouco confiável. Com ele, o Liverpool chegou a duas decisões seguidas de Champions (2018 e 2019), tendo ganhado a segunda.

E, com a defesa menos vazada (22 gols em 38 jogos), ficou a apenas um ponto (98 a 97) de conquistar a Premier League 2018/2019, que ficou com o Manchester City.

A solidez e a competência de Van Dijk na marcação – ressalte-se que ele também é perigoso no ataque, nas bolas paradas, fazendo gols eventualmente – são comprovadas por uma estatística: ficou 50 jogos seguidos sem ser driblado na Premier, de 3 de março de 2018 (quando Mikel Merino, do Newcastle, o superou) até sábado passado, dia 24 de agosto (Nicolas Pepé, do Arsenal, conseguiu o feito).

Com a conquista do prêmio da Uefa, o holandês torna-se o favorito para faturar também o da Fifa (no dia 23 de setembro) e o da France Football (em dezembro, em data a ser anunciada).

Van Dijk comemora gol que fez pela Holanda contra a Alemanha no empate por 2 a 2 em Gelsenkirchen, pela Liga das Nações (John Macdougall – 19.nov.2018/AFP)

Ao falar sobre a possibilidade de ser o contemplado com a cobiçadíssima Bola de Ouro, Van Dijk, atual capitão da seleção de seu país (treinada por Ronald Koeman), declarou não contar com isso, pois há quem, na opinião dele, esteja à frente.

“Para mim Messi é o melhor jogador do mundo, ele merece [ganhar]. Não importa que não tenha chegado à decisão da Champions League”, disse, depois da partida em que o Liverpool derrotou o Tottenham e ganhou a Liga dos Campeões, no começo de junho.

A favor de Van Dijk, para quem não se lembra, há o fato de, nas semifinais da Champions, o Liverpool ter eliminado o Barcelona de Messi (0 a 3 na Espanha, 4 a 0 na Inglaterra).

O título europeu dos Reds é outro ponto que conta a favor dele.

Desde 2014, sempre um jogador do time campeão da Champions é o melhor do mundo: Cristiano Ronaldo (Real Madrid, em 2014, 2016 e 2017), Messi (Barcelona, em 2015) e Modric (Real Madrid, em 2018).

Caso a votação (feita por jornalistas, no caso da eleição da revista francesa) dê a Bola de Ouro a Van Dijk, a Holanda se tornará o país mais laureado nessa premiação: oito vezes – ultrapassando Alemanha (Beckenbauer e Rummenigge, duas vezes cada um, Gerd Müller, Matthäus e Sammer, uma vez) e Portugal (Cristiano Ronaldo, cinco vezes, e Eusébio e Figo, uma).

Já levaram o troféu para casa Johan Cruyff (1947-2016), em 1971, 1973 e 1974, Ruud Gullit, em 1987, e Marco van Basten, em 1988, 1989 e 1992. Todos jogavam do meio para a frente.

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