A deplorável cusparada de Douglas Costa
É com um punhado de dor que escrevo este texto.
Pois terei de fazer uma crítica muito dura a um dos jogadores que mais gosto de ver jogar: o atacante Douglas Costa, da Juventus e da seleção brasileira.
Canhoto de futebol veloz e incisivo, bom driblador e ótimo cruzador, Douglas Costa sempre teve potencial para ser titular da seleção, tanto na ponta esquerda (lugar ocupado de modo cativo por Neymar por toda esta década) como na ponta direita.
Algumas lesões o atrapalharam nos últimos anos, incluindo a na coxa que o impediu de estar 100% em parte da Copa do Mundo deste ano.
Ele foi reserva de Willian no Mundial russo, e o técnico Tite não errou ao decidir dessa maneira. Willian chegou à Copa em grande fase, porém não rendeu o previsto. Douglas Costa, quando requisitado, deu vigor e objetividade ao time canarinho.
Encerrou a Copa tão em alta que no primeiro amistoso no ciclo para o Mundial do Qatar, contra os EUA, no dia 7 deste mês, começou jogando – Willian ficou na reserva.
Na partida em Nova Jersey, vestindo a camisa 7, atuou pela direita do ataque e fez o que dele se esperava já com 11 minutos de jogo. Arrancada rumo à linha de fundo, cruzamento preciso, milimétrico, de pé direito, para Roberto Firmino, na pequena área, empurrar para a rede.
Percebe-se na jogada que ele, enquanto deixava para trás na corrida o lateral Robinson, levantou a cabeça antes de lançar na área, exatamente como deve ser feito – só que nem todos fazem, mesmo alguns dos que defendem seleções ou clubes de primeira linha.
Douglas Costa ainda criou mais duas chances de gol, uma ótima, no começo do segundo tempo, quando colocou Neymar na cara do goleiro Steffen, antes de ser substituído.
Bela atuação, deixando-lhe a promissora possibilidade de, aos 28 anos, firmar-se na seleção a curto prazo.
Em seu clube, a poderosa Juventus, da Itália, ele tenta convencer o treinador Massimiliano Allegri a dar-lhe mais espaço.
A preferência do técnico tem sido por escalar Bernardeschi, Dybala ou Mandzukic entre os titulares no ataque, ao lado do insubstituível Cristiano Ronaldo.
Douglas Costa teve nova oportunidade na partida diante do Sassuolo, no domingo (16), em Turim, ao entrar no jogo aos 16 minutos do segundo tempo.
O camisa 11 deu mais dinâmica à equipe, que ganhava por 1 a 0 (Cristiano Ronaldo) e ampliou para 2 a 0 (Cristiano Ronaldo), em contra-ataque iniciado pelo brasileiro.
A Juve administrou o placar até os acréscimos, quando o visitante diminuiu (Babacar).
Na jogada desse gol, Douglas Costa se enroscou com Di Francesco, ambos caíram, e ao se levantar o brasileiro deu uma ombrada no adversário. Logo depois, tentou uma cabeçada. O juiz Daniele Chiffi viu e advertiu-o com cartão amarelo.
Achei estranho toda essa agressividade (proposital, nota-se claramente pelas imagens) partir do geralmente sereno Douglas Costa, jogador historicamente disciplinado.
Não parou aí. Nos dois minutos seguintes, até o apito final, ele e Di Francesco mantiveram o desentendimento.
Houve ferrenho bate-boca, um cara a cara com o outro, e Douglas Costa cometeu uma atitude das mais repugnantes que existem: deu uma cusparada no rosto do colega de profissão.
Costa vs Di Francesco. #JuventusSassuolo pic.twitter.com/JTs0GA7Jvf
— Everything Napoli (@NaplesAndNapoli) 16 de setembro de 2018
O VAR (árbitro assistente de vídeo) flagrou a cusparada, avisou o árbitro de campo, e Douglas Costa recebeu o cartão vermelho.
Não sei o que Di Francesco disse a ele (ventilou-se que teria havido injúria racial, não comprovada), o próprio Douglas Costa não contou a razão do entrevero, mas nada justifica cuspir em alguém.
A cusparada é execrável, é horrenda: tem o poder de desconcertar o atingido a ponto de fazê-lo sentir-se sujo por fora e enojado por dentro. É pior que um soco, pior que um chute, pior que uma cabeçada.
Lembro-me como se fosse hoje do cuspe que Neto, ex-craque do Corinthians no fim dos anos 1980 e começo dos anos 1990, desferiu no rosto do árbitro José Aparecido de Oliveira em um Corinthians x Palmeiras. Foi em outubro de 1991, e Neto, hoje apresentador e comentarista, ficou (e ficará eternamente) marcado por esse ato asqueroso.
Felizmente, profundamente arrependido, Neto encontrou-se com José Aparecido anos depois e pediu-lhe perdão. Não apaga, mas suaviza. O arrependimento, digno de elogios, alivia a alma do agressor e pode confortar a vítima.
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Douglas Costa percebeu seu erro e, por meio de rede social, escreveu a seguinte mensagem:
“Gostaria de pedir desculpas a todos os torcedores da Juventus por essa minha reação equivocada no jogo. Peço também desculpas aos meus companheiros de time, que estão sempre comigo nos momentos bons e ruins. Errei feio, tenho consciência e venho me desculpar com todos por isso. Deixo claro que essa atitude isolada não condiz com o que sempre mostrei em minha carreira”.
Ok, mas muito longe do suficiente. Incomoda-me, e muito, que Douglas Costa não tenha se dirigido a Di Francesco no texto. Eram principalmente ao rival que as desculpas deveriam ser encaminhadas.
Mas não, não foram. O que me leva a concluir que ele não se arrependeu, não completamente.
Ainda é tempo. Douglas Costa deve vir a público o quanto antes, deixar claro o motivo que o levou, como ele diz, a “essa atitude isolada” e se dirigir diretamente a Di Francesco.
Não é hora de raiva nem de orgulho. E sim de reduzir a enorme mácula na imagem.
Em tempo 1: O primeiro a discordar do triste e condenável acontecimento foi o treinador da Juventus. Massimiliano Allegri antecipou, encerrada a partida, que haverá uma multa a Douglas Costa. “Mesmo que ele tenha sofrido falta, esse tipo de episódio não pode acontecer. Não podemos cair em provocações”, disse o técnico.
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Em tempo 2: A Liga Italiana puniu Douglas Costa, “por comportamento antidesportivo em campo, tendo cuspido no rosto de um adversário”, com uma suspensão de quatro jogos. Só poderá voltar a atuar no Campeonato Italiano no dia 20 de outubro. Na Liga dos Campeões da Europa, ele está apto a ser escalado. A Juventus estreia nesta quarta (19), contra o Valencia, na Espanha.