Técnico escocês propõe juntar homens e mulheres altos para seleção ser competitiva
Quase sempre há desculpas para uma derrota. Derrota essa que pode ocorrer no cenário micro (perder uma partida) ou macro (ser eliminado de um campeonato).
O objetivo não sendo alcançado, jogadores e técnicos posicionam-se diante dos microfones e elencam justificativas para o insucesso. Isso quando resolvem falar, pois, se na vitória todos, felizes, querem se manifestar, na derrota muito poucos dão a cara a tapa.
Gordon Strachan falou. Talvez preferisse o silêncio, chateado que estava, já que a sua Escócia tinha acabado de naufragar nas eliminatórias da Copa do Mundo da Rússia. Mas as regras da Fifa obrigam o treinador a participar da entrevista coletiva pós-jogo.
Uma vitória como visitante no domingo (8) contra a Eslovênia, em Ljubljana, serviria para os escoceses assegurarem uma vaga na repescagem.
Saíram na frente, porém levaram a virada. O empate, já no fim do jogo, de nada serviu – a Eslováquia, rival direta, derrotou Malta e terminou em segundo lugar no grupo vencido pela Inglaterra.
A Escócia não se classifica para um Mundial desde 1998, quando esteve na França e, inclusive, enfrentou o Brasil na primeira fase – perdeu de 2 a 1.

Strachan falou. E não colocou a culpa na arbitragem, nem no estado do gramado, nem na atuação dos jogadores (seus ou do adversário).
Para ele, o problema da Escócia não é técnico, tático ou emocional, mas físico, e com origem genética.
“Fisicamente, temos um problema. Precisamos dar mais duro em cada disputa de bola e pular mais alto que os outros”, disse o ex-volante, que defendeu seu país na Copa da Espanha, em 1982, atuando contra o Brasil na derrota por 4 a 1.
Os dois gols eslovenos saíram depois de bolas alçadas na área escocesa.
“É preciso montar um time capaz de combater a altura e a força (dos rivais) nas jogadas de bola parada. Temos que trabalhar geneticamente, talvez unindo mulheres e homens altos, e ver o que dá para fazer”, complementou o treinador.
Uma declaração esdrúxula. Se Strachan já pensava assim anteriormente, bastava convocar, e escalar, mais atletas de físico privilegiado.
A Escócia não é uma Bolívia, um Equador ou um Peru, nações em que os homens, na média, são considerados baixos (de 1,60 m a 1,65 m). Há oferta de jogadores fortes e altos. A média de altura entre os homens no Reino Unido é de 1,77 m.
Contra a Eslovênia, Strachan escalou um time com 1,80 m de média de altura. Havia dois “baixinhos”: Griffiths (1,70 m), atacante que fez o primeiro gol, e o meia Bannan (1, 69 m).
Na seleção do Leste Europeu, havia um “baixinho”, o atacante Repas (1,71 m). A média de altura dos titulares foi de 1,85 m – a Eslovênia está entre os dez países com população mais alta do planeta.
O autor dos dois gols eslovenos veio do banco de reservas. Bezjak tem 1,79 m, não é nenhum gigante. E tanto a altura não é essencial que a alta Eslovênia não irá à Copa, já que terminou em quarto lugar no grupo.
Assim, Strachan, do alto de seu 1,68 m, arranjou uma bela desculpa para o fracasso.
Sabe-se que o futebol é um dos mais democráticos esportes do mundo quando a questão é a altura. No vôlei, por exemplo, ter menos de 1,95 m (homem) ou menos de 1,80 m (mulher) é quase um impeditivo para jogar em nível profissional.
No futebol, não. Cite rapidamente um grandalhão de grande sucesso. Pensou, ainda esta pensando, aposto.
Sem pensar, eu cito o incomparável Pelé (1,73 m, mas parece menos) e Romário (1, 67 m) como “baixinhos” que deram certo. Dar certo, aliás, é pouco no caso deles. Foram gênios da bola.
E há muitos outros: os argentinos Maradona (1,65 m) e Messi (1,70 m, este ainda em forma exuberante), e mais um brasileiro, Zico (1,72 m). Na atual seleção brasileira, o ataque é formado por Neymar, Gabriel Jesus (ambos 1,75 m) e Philippe Coutinho (1,71 m).
Para completar, os heróis do título nas duas últimas Copas do Mundo são “nanicos”, na comparação com seus companheiros de time.
A Espanha, em 2010, e a Alemanha, em 2014, levantaram a taça graças a gol, na prorrogação, de Iniesta e Götze, respectivamente. O primeiro tem 1,71 m; o segundo, que também parece mais baixo do que é, 1,76 m.
Em tempo: Lorenzo Insigne, de 26 anos e 1,63 m, titular do Napoli (líder do Campeonato Italiano) e presença constante na Squadra Azurra desde 2012, declarou que quase abandou o futebol. Ao site da Uefa o atacante contou que no início de carreira ouviu de olheiros que ele era bom, mas muito baixo. “Houve um momento em que quis largar o futebol, já que todos me diziam a mesma coisa, e pensei que continuar seria inútil.” Acabou fazendo um teste no time de sua cidade natal, Nápoles, onde foi aprovado, e seguiu em frente, atuando por empréstimo em clubes das Séries C e B antes de retornar, cinco anos atrás, ao Napoli. No último Campeonato Italiano, marcou 18 gols e foi o sétimo na tábua de artilheiros. Aliás, Insigne tem como colega de ataque o belga Dries Mertens, outro “baixinho” (1,69 m) que joga muita bola.
Em tempo 2: Faço aqui uma menção honrosa a Naldinho, atacante do Bahia no final dos anos 1980 e começo dos anos 1990. Lembro-me bem de que, com 1,58 m, hábil e veloz, ele vivia levando vantagem sobre os rivais de maior porte. No extinto “Gols do Fantástico” (exibido logo após o famoso programa dominical), semana sim, semana não, lá estava o diminuto e eficaz Naldinho fazendo o seu ou dando assistências para o centroavante Charles.