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A espionagem existe e incomoda, mas há quem a releve

Não se pode afirmar que a espionagem é algo usual, frequente, comum no futebol. Mas que ela existe, e provavelmente sempre existiu, é comprovado.

“O mundo é dos espertos”, sentenciou o treinador do Grêmio, Renato Gaúcho, em novembro de 2017, quando questionado sobre o assunto antes de jogo contra o argentino Lanús pela final da Copa Libertadores.

“Todo clube tem espião. Todo clube brasileiro tem espião. Seleção tem espião”, declarou o ex-ponta-direita (dos ótimos).

Renato se referia à constatação de que o Grêmio utilizara um drone (veículo aéreo não tripulado, controlado remotamente) para espionar treinamentos de adversários durante aquele ano.

“Como se ganha uma guerra? Como se neutraliza o adversário? Com drone, helicóptero, avião”, concluiu, dando escancarado apoio à prática.

Polêmico, já que a espionagem, apesar de não ser ilegal, é recurso que bate de frente com a ética.

Na Europa, eclodiram recentemente dois casos acerca dessa temática que tiveram repercussão, um na Inglaterra, outro na Alemanha, com reação distinta dos técnicos dos clubes alvos da artimanha.

Marcelo “Loco” Bielsa, ex-treinador da seleção da Argentina e hoje à frente do Leeds United, líder da segunda divisão inglesa, admitiu que antes da partida contra o Derby County enviou um emissário para observar, à surdina, o treino do oponente.

Ao ver nas redondezas um estranho, funcionários do Derby desconfiaram e acionaram a polícia, que fez a abordagem e ordenou-lhe que se retirasse. Não houve detenção.

“É minha responsabilidade”, declarou Bielsa à Sky Sports, frisando ter agido sem conhecimento da direção do Leeds. “Há decisões que eu preciso tomar, e não importa se são legais ou não. Tudo bem se o Derby não considera correto e acha que não nos comportamos bem.”

“Falei com Frank e, para ele, eu não respeitei as regras do fair play [jogo limpo]. Penso diferente. Faço isso desde as eliminatórias para a Copa do Mundo [de 2002] com a Argentina. Não está fora da lei”, complementou, assumindo-se como uma espécie de transgressor.

O argentino Marcelo Bielsa, treinador do Leeds United, que diz ordenar a espionagem de rivais desde o começo deste século (Reprodução/Site do Leeds United)

Frank é Frank Lampard, um dos melhores jogadores da história do Chelsea, que faz sua estreia na prancheta com o Derby. E que se declarou terminantemente contrário à espionagem.

Lembrou que, na véspera do duelo de sexta (11), na qual seu time perdeu por 2 a 0 como visitante, ele fazia um treino com atividades táticas, que mostrariam a quem estivesse vendo, incluindo eventuais intrusos, como a equipe se comportaria em campo em determinadas situações.

“Se alguém disser que a tática não é relevante e não afeta o jogo,  então Pep Guardiola [Manchester City], Mauricio Pochettino [Tottenham], Jürgen Klopp [Liverpool] e todos os grandes técnicos são apenas sortudos.”

Há espionado, todavia, que não está nem aí.

É o caso de Julian Nagelsmann, do Hoffenheim, que como Lampard faz parte da nova geração de treinadores – têm 31 e 40 anos, respectivamente; Bielsa está com 63.

O técnico do Hoffenheim, Julian Nagelsmann, em treino da equipe (Lindsay Parnaby - 11.dez.2018/AFP)
O técnico do Hoffenheim, Julian Nagelsmann, em treino da equipe (Lindsay Parnaby – 11.dez.2018/AFP)

Ao saber que o Werder Bremen utilizara um drone para filmar um treino de sua equipe às vésperas do confronto de 19 de dezembro pela Bundesliga – que terminou 1 a 1 –, Nagelsmann deu de ombros para o fato de suas estratégias serem descobertas.

Incomodou-se, porém, com a segurança de seus atletas. “Se você põe uma coisa dessas para voar sobre as pessoas e há um defeito técnico, pode ter sérias consequências.”

Preocupava-ase com a possibilidade de o drone cair e ferir alguém.

Sendo assim, como o adversário não se incomoda com a espionagem, restou ao diretor esportivo Frank Baumann do Werder Bremen, que admitiu ter bolado a trama junto com o treinador Florian Kohfeldt e o departamento de análise do clube, não se desculpar pelo ato, mas pelo modus operandi.

Afinal, da próxima vez que quiserem espionar, pelo depreendido da fala de Nagelsmann, é só bater na porta que o treinador do Hoffenheim deixará entrar, sem neuras.

Em tempo: Até o técnico da seleção brasileira, Tite, fez uso da espionagem – não sei se ainda o faz. No já longínquo 2001, antes da final da Copa do Brasil, Cléber Xavier, auxiliar de Tite no Grêmio, foi flagrado em treinamento do Corinthians de Vanderlei Luxemburgo. Seria interessante saber o que Tite pensa hoje a respeito desse ardil – e se ainda recorre a ele.

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