Zidane foi no Real Madrid um estrategista na arte de ganhar títulos
Chegar ao topo é difícil. Manter-se no topo, mais difícil ainda.
No futebol é assim, sempre foi. Zinédine Zidane sabe.
O treinador francês, que surpreendentemente pediu demissão do Real Madrid nesta quinta (31), conseguiu em seus quase dois anos e meio pelo clube o que ninguém conseguiu – nem, na minha opinião, jamais conseguirá.
Em 13 competições oficiais disputadas, ganhou nove, entre elas três Ligas dos Campeões da Europa, dois Mundiais de Clubes (100% de aproveitamento em ambos) e um Campeonato Espanhol.
Também faturou duas Supercopas da Europa e uma Supercopa da Espanha.
Teve 75% de aproveitamento dos pontos, com 108 vitórias e 31 empates em 158 jogos (oficiais e não oficiais). Foram só 19 derrotas – menos de uma por mês, em média.
Mesmo com todo esse sucesso, nunca se sentiu devidamente valorizado como técnico. Era constantemente criticado pela mídia, para quem lhe faltava a qualidade de estrategista.
A mídia estava errada.
A melhor estratégia que um treinador pode oferecer a uma equipe, muito mais do que implementar esquemas mirabolantes, é a vitória. É amealhar troféus. E isso Zidane fez com maestria.
O Real, sob o comando do sereno Zizou, ergueu uma taça a cada três meses, em média.
Isso em um curto período de dois anos e cinco meses. Isso em seu primeiro trabalho em um time de elite. Isso é o que se pode chamar, sem nenhum exagero, de fenômeno.
Também havia setores da torcida do Real que estavam descontentes com Zidane. Uma espécie de “turma do amendoim” local.
Gente que quer que o time ganhe todo jogo, sempre jogando bem, sempre de goleada. Algo impossível no futebol.
Outro ponto a ser lembrado: talvez o gigante de Madri seja o clube, no mundo, cuja diretoria mais exija de seu técnico.
Qualquer derrota é vista como uma catástrofe. Uma eliminação, então, é uma hecatombe. Treinador, para ser bom, tem que ganhar até par ou ímpar. Dia após dia.

Zidane, frise-se, sempre soube dessa pressão – da mídia, da torcida, da direção. Foi jogador do clube por cinco temporadas, de 2001 a 2006. Nesse intervalo, o time teve seis treinadores, incluindo Vanderlei Luxemburgo.
E, bem ou mal, soube lidar com a corda diariamente em seu pescoço – alguns dias mais apertada, outros mais frouxa.
“Se não vejo com clareza que vamos continuar ganhando, é melhor mudar para não continuar e fazer besteiras”, afirmou ele na entrevista em que anunciou que não cumpriria o contrato que tinha até 2020.
Ficam dois mistérios nesse discurso. O primeiro: quais besteiras ele poderia vir a fazer. O segundo: onde enxergou que não há clareza para prosseguir vencendo.
Pois capacidade Zidane mostrou, com sobras, que tem.
Inclusive de administrar um time repleto de estrelas (Cristiano Ronaldo, Sergio Ramos, Benzema, Bale, Modric, Marcelo, Kroos) e que, justamente por essa fartura de talento, é sempre favorito a ganhar tudo.
Certamente um dia, em uma futura entrevista, ele detalhará os bastidores de sua saída.
É bem possível que haja razões não explicitadas, algo que prefira guardar por ora apenas para si.

Hoje, o que é claro é que, aos 45 anos, Zidane deixa o Real Madrid por cima.
Mídia, torcida, diretoria, todos sentirão saudades de sua figura ilustre e de seu sorriso fácil – e o valorizarão como nunca fizeram.
Zizou sai do Real com as portas abertas, escancaradas até, para voltar. Quando e se quiser.
Em tempo: Quem substituirá Zidane no Real Madrid? O nome mais ventilado nas primeira horas após a demissão do francês é o do argentino Mauricio Pochettino, treinador do Tottenham, da Inglaterra.