Memórias de Neymar em entrevista ao amigo Piqué
Gosto muito do conteúdo do site americano “The Players’ Tribune”, dedicado geralmente a depoimentos de esportistas de diferentes modalidades.
Tanto que já citei em textos anteriores relatos feitos por Marta (brasileira eleita cinco vezes a melhor do mundo), pelo italiano Totti (ídolo da Roma, aposentado no meio deste ano) e pelo alemão Boateng (zagueiro do Bayern de Munique e campeão mundial com a Alemanha em 2014).
A mais recente publicação na seção “futebol” traz uma descontraída entrevista com Neymar. Seu entrevistador é Piqué, ex-colega de Barcelona e campeão mundial com a Espanha na Copa do Mundo da África do Sul, em 2010.
Para quem não lembra ou não soube, à época dos rumores da saída do craque brasileiro do Barcelona, rumo ao PSG, o zagueiro do Barça postou em rede social uma foto dele abraçado com Neymar e a mensagem “Se queda” (“Fica”), interpretada pelo mundo como um atestado de que a negociação não vingaria.
Eu possivelmente fui um dos poucos a fazer outra leitura do “Fica” de Piqué: um pedido para que Neymar não debandasse. Era a meu ver um “Não se vá”, como dizia a música de Jane & Herondy, sucesso nos anos 1970 e 1980.
Como todos bem sabemos, a negociação vingou, e Neymar se foi para Paris.
O que não impediu que ele continuasse amigo de vários companheiros da equipe catalã, com os quais convivera por quatro anos, entre eles Messi, Suárez e o próprio Piqué.
O ponto alto da entrevista, pela dramaticidade, é o momento em que Neymar relembra a joelhada nas costas dada por Zúñiga na partida das quartas de final da Copa do Mundo de 2014, contra a Colômbia, no Castelão, em Fortaleza.
Ocorreu a fratura de uma vértebra, e por muito pouco não houve o encerramento prematuro da carreira de Neymar.
Os médicos, relembra ele, deram-lhe a boa notícia assim: “Você poderá andar, porque se fosse dois centímetros para o lado…”.
“Uau!”, exclama Piqué.
Uau mesmo. Neymar teve sorte, assim como o futebol brasileiro. Escapou da paraplegia por dois centímetros.
Isso, entretanto, não é novidade, mas sabido por todos que acompanham futebol, ainda mais se tratando de um acontecimento dessa relevância e no maior evento futebolístico do planeta.
Outras respostas de Neymar ao “jornalista” Piqué me chamaram mais a atenção.
A primeira quando o beque questiona sobre suas memórias acerca das Copas do Mundo.
Neymar cita primeiro 1994, quando ele tinha dois anos e o Brasil de Romário e Bebeto faturou o tetra, nos EUA. “Um gol que o Romário marcou contra a Holanda. Eu me lembro que o Bebeto cruzou e o Romário bateu de primeira, foi um golaço.”
Memória privilegiadíssima. Eu não me lembro de absolutamente nada do que vi, ouvi ou fiz com dois anos de idade. Só sei de meus atos nos primeiros anos de vida pelo que minha mãe contou.
Neymar também fala de 2002, quando ele estava com 10 anos e o Brasil de Ronaldo, Rivaldo e Ronaldinho conquistou o penta. “Eu assisti a todo o torneio e me lembro de tudo, do Ronaldo… O corte de cabelo do Ronaldo era bom. Eu tinha também.”
Antes da decisão contra a Alemanha, Ronaldo adotou na cabeça o estilo “Cascão”, referência ao personagem da Turma da Mônica. E, com esse visual, marcou os dois gols do jogo.
“Você teve aquele corte de cabelo?”, duvidou Piqué. “Eu adoraria ver isso. Você tem uma foto?”
“Vou procurar. Minha mãe tem, com certeza.”
Oxalá essa foto exista e venha a público. Será um sucesso estrondoso de audiência.
A segunda resposta foi dada à seguinte questão, referente ao Mundial no Brasil, três anos atrás: “Uma palavra para descrever aquela Copa do Mundo?”.
“Uma porcaria!”
À afirmação sucedeu-se uma risada, porém tem alta dose de sinceridade.
Neymar teve a mais séria lesão de sua carreira e, sem ele, a seleção brasileira amargou o pior vexame de sua história, o 7 a 1 para a Alemanha, no Mineirão.
“Prefiro perder de 7 a 1 do que me machucar. Eu estava fora, sem querer ficar de fora.”
Na decisão do terceiro lugar, de quebra, um outro pesadelo, menos pavoroso: Brasil 0 x 3 Holanda.
Não à toa Neymar considera a mais recente Copa uma porcaria. Para ele, em fria análise, foi.
Por isso ele espera com ansiedade a próxima, em junho e julho do próximo ano.
E eis, a respeito do Mundial na Rússia, a terceira resposta que vale menção na entrevista a Piqué.
Pergunta o espanhol: “Você fecha um acordo para a final Espanha 3 x 3 Brasil, incluindo um hat-trick (três gols no mesmo jogo) seu, mas nós ganhamos nos pênaltis?”.
Neymar leva na esportiva, dá risada, mas nega veementemente colocar a glória pessoal, ser “o nome” de uma final de Copa do Mundo, acima do êxito do time canarinho.
“Não, não, não! Eu não quero hat-trick, quero ganhar! Três a três, você faz um hat-trick e nós ganhamos!”, retruca.
É satisfatório ter conhecimento dessa consciência coletiva do hoje disparado melhor jogador brasileiro, principalmente quando é sabido que somente tendo grande destaque individual, e a Copa do Mundo é uma das maiores vitrines de exibição, ele poderá atingir um de seus maiores sonhos: ser escolhido o melhor jogador do mundo.
Pois o Brasil precisará muito de seus gols, porém tanto quanto deles como de suas assistências – hoje são pouquíssimos os que se equivalem ao camisa 10 da seleção nos passes perfeitos para um colega balançar as redes (talvez só De Bruyne, meia belga do Manchester City, seja tão bom garçom).
A conferir daqui a poucos meses se Neymar jogará não só para si mas para o grupo. Tomara!
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