CBF solta lista incompleta de gols mais rápidos da seleção após Diego Souza marcar aos 9 segundos
No amistoso desta terça (13), Austrália 0 x 4 Brasil, em Melbourne, Diego Souza marcou o primeiro gol logo aos 9 segundos de bola rolando. Muita gente publicou que o gol aconteceu aos 10 segundos, teve quem cravou 12 segundos.
Vi o replay do lance várias vezes e posso afirmar categoricamente que a bola ultrapassou a linha do gol defendido por Langerak aos 9 segundos, tendo estufado as redes aos 10 segundos.
Isso escrito, logo que o meia-atacante do Sport Recife fez o gol que passou a ser considerado histórico, uma pergunta óbvia me ocorreu: é o gol mais rápido da seleção brasileira?

Na Olimpíada do Rio, no ano passado, Neymar anotou pela seleção olímpica (até 23 anos, com três jogadores acima dessa idade), contra Honduras, aos 14 segundos. Foi o gol em menos tempo feito em Jogos Olímpicos.
E em relação à seleção principal, que esteve em campo pela primeira vez há mais de um século, em 1914?
Ao encerramento da partida na Austrália, ao entrevistar Diego Souza, o repórter Gregório Fernandes, também assessor de imprensa da Confederação Brasileira de Futebol, informou ao jogador que ele tinha sido o autor do gol mais rápido da história do time.
Ok, mas quem era até então detentor do recorde? Faltou falar.
Enviei, pela manhã, e-mail e telefonei para o departamento de comunicação da CBF para questionar.
Eis a primeira resposta: “O tento supera, por exemplo, o gol do meia Willian, o primeiro na vitória por 3 a 1 contra a Venezuela, pela segunda rodada das eliminatórias para a Copa do Mundo de 2018, marcado aos 36 segundos do primeiro tempo”.
Considerei não assertivo e, portanto, insatisfatório. Decidi acionar a RSSSF, organização que registra estatísticas esportivas mundo afora, a fim de tentar obter a resposta.
No meio da tarde, recebi um e-mail da CBF que avisava sobre a publicação de um texto relacionado ao assunto no site da entidade que comanda o futebol no Brasil.
Ele trazia um ranking dos dez gols mais rápidos marcados pela seleção brasileira principal. Ei-lo:
1 – 13/6/2017 – Brasil 4×0 Austrália – Diego Souza (10s)
2 – 13/10/2015 – Brasil 3×1 Venezuela – Willian (35s)
3 – 8/3/1970 – Brasil 2×1 Argentina – Jairzinho (46s)
4 – 5/9/2004 – Brasil 3×1 Bolívia – Ronaldo (47s)
5 – 2/6/1976 – Brasil 4×3 Pumas UNAM – Gil (1min)*
6 – 25/5/1978 – Brasil 2×2 Seleção Gaúcha – Toninho Baiano (1min)*
7- 8/6/1994 – Brasil 8×2 Honduras – Romário (1min)*
8- 6/9/2016 – Brasil 2×1 Colômbia – Miranda (1min20s)
9- 26/6/1997 – Brasil 7×0 Peru – Denilson (1min40s)
10- 29/5/2016 – Brasil 2×0 Panamá – Jonas (1min50s)
Sobre os asteriscos, o texto, assinado pela Gerência de Arquivo e Memória da CBF, dizia: “Em todos os registros, esses gols aparecem como marcados ao primeiro minuto de jogo, não tendo a indicação dos segundos”.

Olhei para a lista e notei que a data mais antiga era 8 de março de 1970, um tento de Jairzinho, o Furacão da Copa, em amistoso contra a Argentina. “Nenhum gol-relâmpago antes disso?”, pensei.
Telefonei para a CBF, questionei se havia sido feito algum corte no levantamento que tivesse deixado de fora algum gol, e um assessor afirmou que não, que os dados consideravam todos os jogos da seleção principal (são mais de mil) desde 1914.
Não fiquei convencido. Estatisticamente parecia improvável que de 1914 a 1969 nenhum jogador da seleção tivesse feito um gol logo no começo de alguma partida.
Então, à noite, recebi um e-mail da RSSSF Brasil, com informações que mostravam que a lista da CBF estava incompleta.
Escreveu o estudioso Marcelo L. Arruda: “Consultando os meus registros, os gols mais rápidos da história da seleção antes do jogo de hoje (Austrália x Brasil) foram:
23/3/1953 – Brasil 3×2 Chile (Campeonato Sul-Americano) – Julinho (35s)
14/1/1942 – Brasil 6×1 Chile (Campeonato Sul-Americano) – Patesko (45s)
5/9/2004 – Brasil 3×1 Bolívia (Eliminatórias para a Copa do Mundo) – Ronaldo (48s)”
Comparando com a lista da CBF, onde estavam os gols de Julinho e Patesko, marcados bem antes de 1970?
O representante da RSSSF salientou ainda o seguinte: “Existem três jogos, todos amistosos não oficiais, com registro de gol a 1 minuto de jogo, mas sem a informação exata dos segundos:
4/10/1934 – Brasil 8×3 Náutico-PE (amistoso) – Leônidas da Silva
2/6/1976 Brasil 4×3 UNAM Pumas (México) (amistoso) – Gil
25/5/1978 Brasil 2×2 Seleção Gaúcha (amistoso) – Toninho”
No ranking da CBF, não aparece Leônidas, que, segundo Arruda, marcou no início de partida em 1934.
Voltei a acionar a confederação e, na manhã desta quarta (14), recebi a seguinte mensagem da assessoria da entidade: “Atualizamos a lista, com novos dados checados e apurados pela Gerência de Memória e Acervo da CBF”.
O novo top 10 do departamento, que mudou de nome de um dia para o outro (era Gerência de Arquivo e Memória e virou Gerência de Memória e Acervo), ficou assim:
1 – 13/6/2017 – Brasil 4×0 Austrália – Diego Souza (10s)
2 – 23/3/1953 – Brasil 3×2 Chile – Julinho (25s)
3 – 13/10/2015 – Brasil 3×1 Venezuela – Willian (37s)
4 – 25/3/1916 – Brasil 2×2 Uruguai – Douglas Costa (39s)
5 – 14/1/1942 – Brasil 6×1 Chile – Patesko (45s)
6 – 8/3/1970 – Brasil 2×1 Argentina – Jairzinho (46s)
7 – 5/9/2004 – Brasil 3×1 Bolívia – Ronaldo (47s)
8 – 2/6/1976 – Brasil 4×3 Pumas UNAM – Gil (1min)*
9 – 25/5/1978 – Brasil 2×2 Seleção Gaúcha – Toninho Baiano (1min)*
10 – 8/6/1994 – Brasil 8×2 Honduras – Romário (1min)*
Apareceram Julinho, Patesko e Douglas Costa (com o ano errado: não é 1916, mas 2016). E houve mudança na minutagem do gol de Willian (de 35s para 37s) – que ocorreu, conforme publicou a Folha no relato da partida, aos 35 segundos.

Recebi um telefonema de Fernando Torres, da assessoria de imprensa da CBF, que avisou acerca da modificação no ranking. Questionei a razão da não inclusão do gol de Leônidas, e a resposta, desprovida de lógica, foi esta: “Entraram os mais recentes”.
O assessor afirmou que há, além dos relacionados, mais gols marcados no primeiro minuto, sem especificação dos segundos. Ora, por que então não incluí-los e tornar a lista completa?
A CBF precisa ser mais cuidadosa e transparente na elaboração de uma lista dessa importância histórica.
No meu entender, não houve checagem adequada de todos os jogos da seleção, ao menos em um primeiro momento.
Se ela aconteceu, era necessário incluir no ranking todos os jogadores da seleção que anotaram a 1 minuto.
Não é aceitável haver distinção entre Romário e Leônidas, por exemplo, com a justificativa de que o gol do Baixinho ocorreu mais recentemente que o do Diamante Negro.
Por fim, e atenção, pois isso é deveras importante: é impossível dizer com certeza que Diego Souza é o recordista no quesito de gol mais rápido pela seleção.
Por quê?
Volto a apresentar palavras do pesquisador Arruda, da RSSSF: “Existem outros três jogos, também amistosos não oficiais, sem documentação do tempo do primeiro gol (e que, portanto, podem também ter tido abertura-relâmpago do placar):
6/10/1920 – Brasil 1×3 Argentina (amistoso) – Castelhano
24/2/1929 – Brasil 4×2 Rampla Juniors (Uruguai) (amistoso) – Teóphylo
30/9/1934 – Brasil 3×1 Santa Cruz-PE (amistoso) – Patesko”
Sem súmulas ou registros históricos que identifiquem o tempo exato desses gols, e se não aparecer uma testemunha para opinar, jamais saberemos se foram feitos até os 9 segundos ou depois.
Leia também: Belga marca o gol mais rápido das eliminatórias da Copa do Mundo
Em tempo: É adequado a CBF informar claramente quais as fontes que usou para elaborar seu ranking, gol a gol, para que ele seja defensável e fique imune a contestações. Sobre o gol de Toninho contra a seleção gaúcha em 1978, que a CBF e RSSSF registram como feito a 1 minuto, a Folha informou que ocorreu aos 2 minutos. Em relação ao gol de Jairzinho diante da Argentina em 1970, a Folha registrou o tento a 1 minuto e meio – segundo a CBF, aconteceu aos 46 segundos. O gol de Ronaldo Fenômeno em 2004 contra a Bolívia, de acordo com a Folha, saiu aos 46 segundos, e não aos 47 segundos, conforme atesta a CBF.