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Para técnico campeão do Sul-Americano sub-17, Neymar e Gabriel Jesus são pontos fora da curva

Luís Curro

Depois do fiasco no mês passado da seleção brasileira sub-20, que não conseguiu se classificar para o Mundial da categoria no Sul-Americano do Equador, o que resultou na demissão do treinador Rogério Micale (campeão olímpico da Olimpíada do Rio-2016), a performance de outra seleção nacional, a sub-17, entrou no meu radar.

Seria bem preocupante, em relação às perspectivas futuras do futebol brasileiro, se mais uma leva de garotos sucumbisse e não carimbasse o passaporte para a principal competição de sua categoria.

No torneio realizado no Chile, entretanto, a seleção sub-17 teve um ótimo desempenho. Com sete vitórias e dois empates, faturou o título e disputará o Mundial da Índia, em outubro. Na decisão, dominou o anfitrião e ganhou, sem sustos e com atuação mais que convincente, por goleada: 5 a 0.

Jogadores da seleção brasileira sub-17 comemoram gol na última partida do torneio, vitória por 5 a 0 sobre o anfitrião Chile, em Rancagua (Gregório Fernandes/CBF)

Mesmo antes da partida que valia o título, estava claro que a seleção sobrava.

Então solicitei à CBF (Confederação Brasileira de Futebol) uma entrevista com o técnico da equipe, com o intuito de saber um pouco mais sobre esse time e obter a opinião dele a respeito do que eu (e aposto que você, leitor, também) quero saber: quem deve estar em breve brilhando nas equipes de cima, no Brasil ou no exterior? Quem são os craques do time?

Esperava que Carlos Amadeu, de 51 anos, que dirige a seleção sub-17 desde 2015 e que é bem pouco conhecido do grande público, citasse alguns nomes.

Não citou um único. Nem mesmo o dos artilheiros do time, o ponta-esquerda Vinicius Júnior e o centroavante Lincoln, ambos do Flamengo. Amadeu mostrou precaução e preferiu enaltecer o coletivo.

O sucesso individual de cada um, opina Amadeu, dependerá de uma série de circunstâncias, e ele considera arriscado fazer previsões acerca de um garoto de 16 ou 17 anos. Pois hoje esse garoto pode comer a bola e, em poucos meses, sumir do mapa da bola.

Uma ascensão rápida no clube e a chegada precoce à seleção adulta, diz, são exceções. “Gabriel Jesus e Neymar são pontos fora da curva.”

O treinador do Brasil sub-17, Carlos Amadeu (Rafael Ribeiro/CBF)

A seguir, a entrevista que o baiano Amadeu, fã declarado de Telê Santana (morto em 2006), Tite e Zagallo, deu a “O Mundo é uma Bola”.

Que avaliação você faz do desempenho da seleção sub-17 no Sul-Americano?

Carlos Amadeu: O aproveitamento que obtivemos esteve dentro do que a gente planejou e esperava e dentro do potencial que a equipe tem. Tivemos algumas dificuldades com o campo que enfrentamos na primeira fase, que não proporcionava o melhor estilo de jogo para a gente, que é colocar a bola no chão, mas nos adaptamos muito rápido. Quando viemos para um campo com um nível melhor, ficou evidente o quanto o time cresceu. Quem conhece o potencial do grupo sabe que eles (jogadores) tinham essa capacidade. Se comportam bem durante toda a preparação, não só os 19 dias que passamos juntos mas durante os dois anos que eles vêm (juntos), do sub-15 até os dias atuais.

Tecnicamente, que jogadores merecem ser citados como os de maior destaque?

Carlos Amadeu: Quando a gente fala de jovem tem que ter um cuidado especial. Lógico que a imprensa e a torcida precisam de nomes. Precisam destacar alguém. Toda história tem que ter um vilão e um herói, e a gente não trabalha dessa forma. A gente trabalha de forma coletiva, só pensa na equipe e no desenvolvimento desses atletas. Quando a equipe está indo bem, as individualidades aparecem. Eu vi ora um jogador se destacar em um jogo, ora outro jogador se destacar. Posso dizer que não consigo enxergar nenhum jogador que está destoando do grupo. Um grupo que é muito sólido, sabe o que quer e tem uma maturidade acima da vista nos jovens de 16, 17 anos.

No aspecto tático, qual seu esquema favorito?

Carlos Amadeu: A seleção brasileira sempre teve no seu histórico e sempre agradou ao seu torcedor quando jogou um futebol de bola no chão, de toques, de triangulações, de jogo de aproximação, de predomínio da posse de bola. E de forma agressiva, buscando o gol durante os 90 minutos. Ganhando e dando espetáculo. Essa é a identidade do futebol brasileiro, é como a seleção brasileira é identificada internamente e pelo resto do mundo. A gente respeita essa identidade. Além disso, eu trabalho no futebol de base desde 1991 e respeito muito as características dos jogadores que eu tenho. Não adianta eu ter um esquema ideal se os jogadores não se adequam a ele. Então não tenho um esquema ideal, mas tenho uma filosofia, e os jogadores têm que se adaptar a essa filosofia.

Amadeu, que comanda a seleção sub-17 há quase dois anos, orienta os jogadores em treino (Gregório Fernandes/CBF)

Na sua avaliação, há algum jogador na seleção sub-17 em condição de ser utilizado já pela equipe profissional de seu clube?

Carlos Amadeu: Não tenho como avaliar se o jogador tem condição de jogar na equipe dele porque eu teria que avaliar a filosofia com que o treinador trabalha e a identidade do clube. Temos jogadores aqui que podem ter um futuro brilhante e chegar à seleção brasileira principal. E esse é o nosso trabalho. Selecionar os melhores jogadores por posição e não apenas aqueles que podem ser campeões só pelo aspecto físico. Ou seja, ganha-me pela força mas não pela qualidade e depois esses jogadores não vão chegar à categoria acima ou à equipe principal. Nosso objetivo é selecionar os melhores jogadores, mesmo que sejam mais fracos fisicamente e montar um conjunto que consiga, de uma forma inteligente, vencer os adversários pela qualidade técnica e pela postura de jogo. E esses atletas ganhando confiança, independentemente da força física, fazem o jogo mais técnico prevalecer. Ganhando confiança eles chegam às categorias mais acima, sendo lançados por seus clubes de forma equilibrada, sem precipitação. E se o entorno, família, empresários, amigos, todos colaborarem com o crescimento deles, eu acho que muitos jogadores aqui têm condição de chegar à equipe principal do Brasil dentro de três, quatro anos. O Gabriel Jesus chegou muito rápido à seleção sub-20, à olímpica e à profissional. É um ponto fora da curva… Gabriel Jesus, Neymar. A gente não arrisca dizer que tem esse jogador fora da curva porque esse jogador ainda não atuou pelo profissional. Seria precipitado, como muitas vezes acontece.

Quais treinadores você admira e tem como referência?

Carlos Amadeu: Tenho como referência muitos técnicos brasileiros, como Telê Santana, Evaristo de Macedo, Abel Braga, Oswaldo de Oliveira e Tite, que é um exemplo para todos os treinadores do Brasil. Acredito muito na qualidade dos nossos profissionais, que sempre foram referência para o mundo. O Zagallo, por exemplo, eu tenho uma foto dele como plano de fundo da tela de meu computador, tamanha minha admiração. Muitas vezes, a própria qualidade de nossos jogadores ofuscou a capacidade de nossos técnicos, mas eles precisam ser valorizados.

A seleção sub-17: Gabriel Brazão, Lucas Halter, Lincoln, Victor Bobsin, Weverson e Vitão (de pé, da esq. para a dir.); Wesley, Marcos Antonio, Paulinho, Alanzinho e Vinicius Júnior (agachados, da esq. para a dir.) (Gregório Fernandes/CBF)

Em tempo: Já que Carlos Amadeu achou melhor não elencar nomes, eu o faço. Pelo que pude ver no Sul-Americano sub-17, além dos já citados Vinicius Júnior e Lincoln, estes jogadores merecem especial atenção: Alanzinho (meia, Palmeiras), Paulinho (atacante, Vasco) e Gabriel Brazão (goleiro, Cruzeiro). Parecem ser melhores que os demais.

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