Goleiros da Costa Rica treinam com óculos escuros para burilar habilidades
Quando eu era um adolescente, fazia treinos de natação no Hobby, na região central de São Paulo. O local, que não existe mais, era uma escola de esportes/academia.
Cheguei a ser federado, era bom nadador, mas a concorrência sempre foi superior, e minha única medalha em um campeonato tido como relevante foi um bronze, em prova de 100 m borboleta disputada no tradicional Clube Esperia, localizado às margens da marginal Tietê.
Sendo este um blog de futebol (internacional), por que menciono um fato particular, e fato este ligado a outro esporte, a natação?
Seria porque este sábado (24) é o primeiro dia de competições no Centro Aquático de Tóquio, sede da natação na Olimpíadas, e competidores estão lá dando suas braçadas? Não.
A razão é esta: li nesta semana uma notícia, publicada nos sites ESPN Deportes e Fútbol Centroamérica, que me fez relacioná-la com essa minha experiência, vivida nos anos 1980.
Leonel Moreira, Esteban Alvarado e Patrick Sequeira, os goleiros da seleção da Costa Rica que disputa nos EUA a Copa Ouro –competição que reúne países das Américas do Norte e Central e do Caribe–, têm treinado com óculos escuros.

A ideia partiu de Felipe Camacho, responsável pela área psicológica da seleção costarriquenha, com o objetivo de melhorar o desempenho dos arqueiros nas partidas.
“Esses óculos trabalham com as informações dadas pelo sistema visual, a interpretação que o cérebro dá para enviar uma resposta motora, ajudando o jogador ter uma velocidade de reação mais rápida”, afirmou Camacho.
Segundo ele, equipes da NBA e da NFL –as ligas mais famosas de basquete e de futebol americano no mundo, respectivamente– estão fazendo uso dessa prática.
Os óculos escuros, entretanto, não são aqueles comuns, que as pessoas usam no dia a dia. Há tecnologia envolvida, explicou o psicólogo.
“Eles [goleiros] os colocam e há [a emissão de] flashes de luz que suprimem o sistema visual por segundos. Faço esse controle por um software e acompanho a evolução.”
“Isso os força a uma distorção cognitiva, ou seja, um exercício que era extremamente fácil passa a ter um grau de complicação. Eles se acostumam a treinar assim e quando voltam [a ficar sem os óculos] é mais fácil [fazer as defesas]”, concluiu Camacho.

E tem funcionado na prática?
Na Copa Ouro, até aqui, a Costa Rica disputou três partidas, contra Guadalupe, Suriname e Jamaica. Ganhou todas e nelas levou dois gols (um no primeiro jogo, outro no segundo), uma marca positiva.
Além disso, a atuação sob as traves mostrou-se bastante satisfatória. Os adversários finalizaram corretamente contra a meta de Moreira ou Alvarado, que participaram desses jogos, 21 vezes, e os goleiros defenderam 19 das tentativas.
Mas foi resultado das atividades com os óculos escuros? Os guarda-metas e o treinador costarriquenhos, assim como o psicólogo, certamente dirão que sim.
Quanto a mim, não, eu não nadava com óculos de natação com lentes escuras ao treinar na piscina do Hobby, na avenida Angélica. E não havia nenhum tipo de software envolvido.
Semanas antes de conquistar a medalha no Esperia (ainda a tenho, é a minha “conquista olímpica”), passei a usar, por cima da sunga, um calção que tinha, tanto na parte dianteira como na traseira, bolsos enormes costurados, externamente.

Recomendação da professora Tamara, o calção tornou-se um tremendo inimigo.
Ao dar minhas braçadas, os bolsos se enchiam de água e me faziam redobrar o esforço para conseguir avançar.
Era um martírio sair do lugar, eles realmente dificultavam minha vida. Sentia-me uma tartaruga na piscina.
O resultado, contudo, era visto na tomada de tempo, realizada sem o calção com os bolsos. Só de sunga, eu “voava” na piscina, e o cronômetro exibia números positivos.
O calção me fez ser melhor como esportista, mais confiante e mais competitivo; eram à época os óculos hoje usados pelos goleiros da Costa Rica.
A medalha, estou certo, veio como consequência desse treinamento. No aquecimento para a prova, usei o calção já chamado de amigo. Sem ele na competição, marquei meu melhor tempo e fui ao pódio pela única vez.