Fifa desconversa e alimenta polêmica sobre Palmeiras ter ou não Mundial
Entidade máxima do futebol, a Fifa é a responsável por alimentar uma grande polêmica que existe há anos: o Palmeiras é ou não campeão mundial?
A federação admitiu em duas ocasiões, uma em 2007, outra em 2013, que o time paulista era, sim, o primeiro campeão mundial de clubes, por ter ganhado, em 1951, a Copa Rio, disputada no Brasil.
São os famigerados fax.
Teoricamente, bastariam esses dois documentos, assinados por Urs Linsi (o primeiro) e por Jérôme Valcke (o segundo), ambos ex-secretários-gerais da Fifa, para que o assunto tivesse sido encerrado, com vitória palmeirense.
O texto de 9 de março de 2007, endereçado ao então presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, afirma que “em referência ao reconhecimento da Copa Rio de 1951 como o primeiro Mundial de Clubes”, em pleito solicitado por Palmeiras e CBF, “temos o prazer de anunciar que a Fifa concorda com a proposta e aceita a Copa Rio como o primeiro Mundial de Clubes oficial”.

Está bem claro, e não seria necessário mais nada, o assunto estaria encerrado. Só que a Fifa banca uma informação e depois a desbanca.
A Folha publicou no dia 27 de abril daquele ano que o documento assinado por Linsi precisaria ainda ter a chancela do Comitê Executivo da entidade –o que não ocorreu.
Seis anos depois, em 2013, Valcke assim escreveu ao então ministro do Esporte, Aldo Rebelo, que é palmeirense e fazia lobby pelo clube do coração em relação à Copa Rio de 1951: “Gostaríamos de oficialmente confirmar o torneio acima citado [Copa Rio] como o primeiro Mundial de Clubes realizado”.
O texto, de 23 de abril, cita o triunfo do Palmeiras na final diante da Juventus, da Itália, e afirma que “para assegurar que os arquivos históricos dessa competição estejam atualizados, circularemos uma cópia desta carta internamente e atualizaremos nossos arquivos no Fifa.com”.

Resolvido? Não. Essa atualização não ocorreu, o que manteve em suspenso o que a Fifa, com a firma do dirigente de maior importância na entidade após o presidente (à época era Joseph Blatter), anunciou pela segunda vez.
Em 7 de junho de 2014, reunião do Comitê Executivo da Fifa trouxe a seguinte declaração: “Concessão do pedido da CBF para reconhecer o torneio de 1951, entre clubes europeus e sul-americanos, vencido pelo Palmeiras, como a primeira competição mundial de clubes”.
Note que “primeira competição mundial interclubes” não é “primeiro Mundial de clubes”. Há diferença.
O mais intrigante é que a Fifa, mesmo sabendo que esse tema desperta um interesse enorme dos torcedores brasileiros, em especial os do Palmeiras e os de seus maiores rivais (Corinthians, São Paulo e Santos), não parece interessada em ser assertiva.
Entrei em contato por email com a assessoria da Fifa durante a semana fazendo uma pergunta clara: “A Fifa considera o Palmeiras campeão mundial por ter ganhado a Copa Rio de 1951?”.
Bastaria um “sim” ou um “não”, mas a resposta me direcionou a uma publicação da entidade para os jornalistas, de 27 de outubro de 2017, que trazia os temas tratados em reunião do Conselho da Fifa.
O último parágrafo diz o seguinte, como sendo uma das decisões tomadas no evento: “Reconhecimento de todos os clubes europeus e sul-americanos que ganharam a Copa Intercontinental –jogada de 1960 a 2004– como campeões mundiais”.
Ou seja, perguntei “x” e responderam “y”.
Voltei a indagar a Fifa, dessa vez mencionando os fax assinados por Linsi e Valcke e reforçando que ambos declaravam a legitimidade do Palmeiras como campeão mundial de clubes em 1951.
A resposta: “Veja a resposta que demos anteriormente. Não temos mais comentários a fazer”.
Lamentavelmente, só resta concluir que a Fifa deu a já famosa “sabonetada”. Enrolou, disfarçou, tergiversou –e não esclareceu.
Desse modo, a polêmica continua. O Palmeiras é ou não o primeiro campeão mundial de clubes? Seus torcedores têm a certeza de que é. Os demais, a certeza de que não é.
A Fifa, ao enviar documentos certificando o feito, e depois negando-se a confirmar ou mesmo a prestar esclarecimentos, preferindo desconversar, presta um desserviço ao futebol.

A pergunta que será feita, caso o Palmeiras conquiste o Mundial da Fifa que está em andamento no Qatar, é: o clube é campeão ou bicampeão mundial? Se for bi, iguala-se a Corinthians (2000 e 2012) e Santos (1962 e 1963) e cola no São Paulo (1992, 1993 e 2005).
E, caso a Fifa não diga com todas as letras o que vale em relação à Copa Rio de 1951 (um torneio de extrema importância, com toda a cara de Mundial), se a chancela ou não como Mundial, “pra valer e pra sempre”, a polêmica se prolongará indefinidamente.
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Em tempo: Questionei na manhã desta sexta (5) a CBF para saber a posição da entidade acerca do assunto, porém não houve resposta até a publicação deste texto.