Neymar tem nele os holofotes, mas o iluminado pode ser Coutinho
Só se fala de Neymar. Todos só têm olhos para Neymar. É Neymar quem está na crista da onda.
A mídia esportiva se deleita com o ressurgido protagonismo, inesperado para muitos, do mais popular craque brasileiro da atualidade.
Às vésperas da decisão da Liga dos Campeões da Europa, dez entre dez comentaristas esportivos, e o grande público junto com eles, estão ansiosamente à espera do desempenho do camisa 10 do Paris Saint-Germain no jogo deste domingo (23) contra o alemão Bayern, às 16 horas (de Brasília), com transmissão na TNT e no Facebook.
Terá Neymar a capacidade de liderar o PSG a seu segundo título internacional de relevo, o primeiro desde a conquista da Recopa europeia, no já distante 1996?
Afinal, foi para conduzir o bilionário clube parisiense ao topo da Europa que ele foi contratado do Barcelona por € 222 milhões, em 2017, até hoje a mais cara transação do futebol.
Nas quartas de final, contra a Atalanta (2 a 1), e na semifinal, contra o Leipzig (3 a 0), Neymar perdeu gols que ficaram esquecidos, já que jogou muito bem as duas partidas e deu uma assistência em cada uma delas –a diante do time alemão, belíssima.
Foi o suficiente para ser efusivamente incensado pelos jornalistas planeta afora, não sem merecimento, é bom frisar.
Tendo todos os holofotes sobre ele, especialmente os vindos do Brasil, como reagirá Neymar diante da potência de Munique, favorita para erguer a taça?
As luzes focadas em sua silhueta não são novidade em sua carreira, tendo a torcida presente ou não (e desta vez não haverá, devido à pandemia de coronavírus que impede a ida de torcedores ao estádio), então é improvável que Neymar sinta-se pressionado, apesar de a pressão ser iminente.
Pela frente, um Bayern que está invicto há 26 partidas, sendo 25 delas vitórias, e que triunfou nas 20 mais recentes. Desde 19 de janeiro, o dia do início da invencibilidade, marcou 84 gols (média de 3,2 por jogo) e levou 19 (0,7).
Um Bayern que já sentiu o gosto de ganhar o mais nobre interclubes do velho continente cinco vezes, menos somente que o Real Madrid (13), o Milan (7) e o Liverpool (6).
Um Bayern que tem o artilheiro da Champions, o centroavante polonês Lewandowski, 15 gols em nove partidas –ele não deixou de balançar as redes em um jogo sequer.
Um Bayern que tem a sensação Gnabry, o inflamado Thomas Müller, o paredão Neuer, a revelação Davies, e Kimmich, e Alaba, e Perisic, e Thiago Alcántara, todos excelentes.
Aguardemos Neymar. Que, como já escrito, usa o número 10, o mais cobiçado pelos boleiros, algarismo com o qual brilhou Pelé, o melhor de todos os futebolistas, e Maradona, e Puskás, e Platini, e Zidane, e Messi.
Quase ignorado, aliás, está o camisa 10 do outro lado, o do Bayern.
Que também é brasileiro. Que também custou muito dinheiro em sua mais recente negociação. Que também deve, no seu âmago, sonhar em ser o herói da decisão em Lisboa, em ser iluminado no estádio da Luz.
Titular da seleção brasileira, como Neymar, na Copa do Mundo de 2018, hoje com 28 anos, como Neymar, Philippe Coutinho é reserva no Bayern, a quem o Barcelona o emprestou.
Barcelona que pagou € 120 milhões ao Liverpool em 2018 para se frustrar com seu desempenho oscilante.
No fim de abril, quatro meses atrás, Coutinho, que prosseguia inconstante no Bayern, passou por uma cirurgia no tornozelo do pé bom, o direito.
Se não fosse a pandemia de Covid-19, que atrasou o andamento da temporada 2019/2020, ele não participaria da reta final da Champions.
Está participando.
Diante do Barcelona, no histórico 8 a 2 nas quartas de final, no estádio da Luz, entrou faltando 15 minutos. Fez dois gols, os que finalizaram o enterro do time espanhol.
Contra o Lyon, na semifinal, em outra arena lisboeta (José Alvalade), entrou faltando 15 minutos. Fez um gol, anulado, pois o companheiro Goretzka resvalou na bola no cruzamento e o deixou impedido.
Se o treinador Hans-Dieter Flick repetir o que tem feito, Coutinho terá pelo menos 15 minutos de ação contra o PSG.
Não se sabe agora se quando ele entrar a final estará indefinida, nem o que terá acontecido até aquele momento.
Mas o futebol muitas vezes desvia muito rapidamente os holofotes de um personagem para outro.
Eles estão em Neymar, e continuarão nele no início e no decorrer da decisão no estádio da Luz. Podem subitamente passar a focalizar Coutinho, improvável raptor do estrelato do compatriota. E dar a vitória ao Bayern, sendo eleito o melhor em campo.
O ressurgimento de Neymar passaria a ser o de Coutinho.
Impossível uma melhor volta por cima para o meia-atacante, prestes a retornar a um Barcelona que pode ficar sem Messi e, assim, estar desesperado por um craque para reerguê-lo.
É um enredo imaginário, uma suposição, talvez um devaneio que jamais aconteça. Mas que seria um final surpreendente e fascinante para o desfecho da temporada, seria.
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Em tempo: Philippe Coutinho é o solitário representante brasileiro no Bayern na decisão da Champions League. O PSG, além de Neymar, tem o zagueiro Thiago Silva, capitão da equipe, e o zagueiro-volante Marquinhos, que fez gol tanto nas quartas de final como na semifinal.