Juiz expulsa gandulas e tem que ele mesmo buscar a bola
Entre os personagens de uma partida de futebol, o mais relevante é a bola. Sem ela, não há jogo.
Os jogadores também são vitais, pois a bola não joga sozinha, precisa de quem a faça rolar.
Em jogos sérios (excluo as peladas, apesar de muitas serem disputadíssimas), sejam os por competição, sejam os amistosos, árbitros e assistentes são necessários, para fazerem valer as regras.
Há também os treinadores, que cuidam das ordens táticas, do empurrão motivacional e das substituições, e os torcedores, que além de torcer também riem, descabelam-se, roem as unhas, xingam e vaiam – os atletas rivais ou os do próprio time.
Acabou? Não. Uma figura não menos importante, porém quase sempre esquecida, é a do gandula. O apanhador de bolas.
Antigamente, quando a pelota saía do campo, não havia outras nas laterais ou na linha de fundo, para que, como ocorre hoje, a partida possa ser rapidamente reiniciada.
Havia as bolas reservas (duas ou três), mas elas ficavam com o árbitro reserva e só eram disponibilizadas se houvesse um problema com a titular – ela murchasse ou, quando chutada para a área dos torcedores, um deles a pegasse e não a devolvesse.
Dessa forma, até determinado momento do fim do século 20 (anos 1980 ou anos 1990), repetidas vezes via-se o gandula correndo desenfreadamente atrás da redonda. Enquanto ele não a pegasse e fizesse a reposição, o jogo ficava parado.
Atualmente, com várias bolas disponíveis perto de cada um dos gols ou na linha lateral, os gandulas têm mais tempo para cumprir sua função e passam a maior parte das partidas despercebidos.
Só se dá pela falta deles em jogos à antiga. Pois não é em todo campeonato que há fartura das esféricas à disposição.
Na quinta divisão da Inglaterra, por exemplo, é assim. A bola sai do campo, o gandula sai atrás.
Algo também visto em outros tempos, o interesse que o gandula dedica a pegar rapidamente a bola é proporcional ao desempenho do time mandante.
Se este está perdendo, o gandula é um velocíssimo guepardo. Se está ganhando, torna-se mais lento que uma tartaruga.
Em Yeovil Town x Bromley, no sábado (28), pela quinta divisão do Campeonato Inglês, a equipe da casa começou perdendo e conseguiu a virada contra o líder, aos 27 minutos da segunda etapa. Ampliou para 3 a 1 aos 33 minutos, e precisaria segurar a vantagem por cerca de mais 15 minutos.
Charlie Lee lobbing the goalkeeper with a header.
An iconic Jimmy Smith celebration.
Three points.
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— Yeovil Town FC (@YTFC) September 29, 2019
Os gandulas no estádio Huish Park, designados para o trabalho pelo Yeovil Town, não debandaram – o que, no século passado, acontecia –, porém passaram a fazer “corpo mole”. Pressa nenhuma para buscar e devolver a bola.
Essa atitude irritou de tal maneira o árbitro Aaron Jackson que, faltando cinco minutos para o fim do tempo regulamentar, ele decidiu expulsar não apenas um, mas todos os oito gandulas que atuavam na partida.
“Um dos gandulas atrasou a devolução da bola e recebeu uma advertência. Quando ele repetiu a atitude logo depois, o juiz o expulsou, e ordenou que todos os demais [gandulas] também saíssem”, declarou Chris Spittles, da rádio BBC Somerset. “Nunca vi nada parecido.”
A partir daí, sem a presença dos personagens responsáveis por tão específica função, coube ao próprio Jackson fazer as vezes de pegador de bolas, conforme relato do Yeovil Town.

O esforço do árbitro-gandula, contudo, não alterou o placar.
O Bromley, apesar de se manter na liderança, perdeu a invencibilidade de 13 partidas no campeonato (oito vitórias e cinco empates), e o Yeovil Town, ao ganhar o sétimo jogo seguido, ficou a somente um ponto do rival, na terceira colocação.
Em tempo: A origem do termo gandula para denominar o catador de bolas no futebol teria surgido na década de 1930, no Rio de Janeiro, em uma variação do termo “gandulo”. De gandulos eram chamados os garotos desocupados que ficavam à beira dos campos assistindo aos jogos entre amadores e que, quando a bola saía, corriam atrás dela para pegá-la e devolvê-la aos jogadores. Houve também a difusão de que o termo ter-se-ia originado do atacante argentino Bernardo Gandulla, que defendeu o Vasco em 1939 e 1940. Por não ter sido inscrito a tempo em uma competição devido a questões burocráticas, ele ficava de fora torcendo e, por puro voluntarismo, buscava as bolas que deixavam a área de jogo, fazendo as vezes do gandula.