Videoarbitragem anula gol marcado e marca gol anulado
A polêmica em torno da videoarbitragem continua, sem prazo para terminar.
A tecnologia batizada de VAR (video assistant referees), uma das bandeiras da Fifa, passou por mais um teste no amistoso entre França e Espanha, na semana passada, em Saint-Denis.
E os franceses se deram mal com a ajuda que o árbitro alemão Felix Zwayer recebeu dos analistas de arbitragem incumbidos de ajudá-lo.
Essa turma de apoio conta com as imagens da televisão para se posicionar em lances duvidosos nas seguintes situações: gols, pênaltis e advertências, incluindo expulsões. A comunicação entre o árbitro e “o cara da TV” é feita por um ponto eletrônico.
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Com a partida empatada em 0 a 0, Griezmann abriu o placar para os Azuis aos dois minutos e meio do segundo tempo. Festa do atacante, festa dos seus companheiros, festa no Stade de France.
Depois de 45 segundos, porém, frustração para Griezmann e para a esmagadora maioria dos quase 80 mil torcedores no estádio. Zwayer anulou o gol depois de ser alertado de que havia impedimento de Kurzawa, que participou do lance.
Havia mesmo – não um impedimento claro, mas havia. O bandeirinha não viu.
Foi o primeiro gol da história anulado pelo VAR. Meses atrás, ele determinou a primeira expulsão.

Dito isso, é imprescindível expor o comentário do goleiro e capitão francês, Hugo Lloris, ao jornal “L’Equipe”, com o qual concordo:
“É uma evolução no nosso esporte (o uso do VAR). É bom porque há mais justiça nas decisões. Mas também pudemos ver que mata a emoção do gol. Os torcedores e os jogadores, todos acharam que tinha sido gol. Levou quase um minuto para que voltassem atrás na decisão. Houve uma pausa, e não estamos acostumados com isso no futebol”.
O futebol, na maioria das vezes, ficará mais justo com o uso da videoarbitragem.
Porém a que preço?
Não apenas o preço da implementação do sistema. Pois, já que a Fifa quer implantá-lo em nome da justiça, tem que dar um jeito de fazê-lo em todo o mundo. Se não, a “justiça” só valerá para poucos, para os países mais endinheirados, os que podem bancar a parafernália tecnológica.
É certo isso? Não. Então a Fifa precisa botar a mão no bolso, gastar uns milhões dos dólares que arrecada e implantar o VAR em todo lugar.
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O maior ônus, entretanto, é o citado pelo goleiro francês: o “voltar atrás”, depois de uma “eternidade” (45 segundos são muito tempo no futebol), é prejudicial ao espetáculo.
Esse é o ponto, conforme afirmou Lloris: o VAR mata a emoção do gol.
Jogadores e torcedores terão de se acostumar com a decepção. Ela existirá, e não será aquela imediata, já conhecida por todos, quando, por exemplo, o auxiliar levanta a bandeira e assinala o impedimento. Será com “delay”.
Enfim, a mensagem é esta, e deveria ser anunciada antes do início da partida, para não haver esquecimento: “Respeitável público, honoráveis atletas, todo gol está sujeito a ser anulado pela tecnologia. Antes de comemorar, recomenda-se esperar um minutinho.”
E tem também um outro recado, não menos relevante: “Se um gol do seu time for anulado, não se lamente, não fique triste, não fique bravo. O VAR pode mudar a decisão tomada em campo. Antes de xingar o juiz ou seus auxiliares, recomenda-se esperar um minutinho”.
Pois foi exatamente o que aconteceu, também na partida entre franceses e espanhóis.
Aos 31 minutos da etapa final, Jordi Alba cruzou da esquerda para Deulofeu, que mandou para o gol. O atacante espanhol nem festejou, pois o bandeirinha levantou seu instrumento e apontou impedimento.
Só que não. O VAR entrou de novo em ação e, cerca de 45 segundos depois da jogada, Deulofeu pôde comemorar, já que Zwayer validou o gol. Uma cena estranha, meio artificial. Algo assim: “Pessoal, venham cá, podem me abraçar agora, foi gol”.

Na opinião de Griezmann, que teve seu gol invalidado, “é irritante, porque você terá de esperar para poder comemorar o gol”.
Colega de Griezmann na seleção francesa, o jovem talento Mbappé, de 18 anos, ponderou, exagerando no tempo que a arbitragem levou para tomar a decisão: “A demora é um problema. Nós esperamos dois minutos, e em dois minutos você esfria e ainda leva um golpe psicológico”.
Conformado, Griezmann acrescentou: “Se eles (autoridades da bola) quiserem, vão usar (o VAR). Nos resta continuar a jogar futebol”.
Sim, Griezmann, eles vão querer, mais e mais.
O “futecbol”, repito o que escrevi em outras ocasiões, veio para ficar. Será a era do “aguarde um minutinho, por favor”.
E então, gostou desse novo futebol? Eu não. Mas será preciso aceitar, pois não tem volta – querendo-se ou não, será assim.
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Em tempo: A Espanha ganhou o amistoso por 2 a 0. David Silva marcou, de pênalti, o primeiro gol. Franceses consideraram que Koscielny não fez falta em Deulofeu no lance em que o árbitro assinalou a penalidade máxima e não entenderam por que o jogo não foi interrompido para que o VAR desse seu veredicto. Possivelmente porque Zwayer (o juiz) não teve dúvida e porque o “cara da TV” também não. Eu já vi pênaltis serem marcados nesse tipo de lance e outros não serem. Se em todo lance duvidoso na área a partida for parada para revisão, ela será várias vezes. E, se o VAR for levado a sério, a partida deveria ser interrompida essas várias vezes, mas sabemos que não será assim. E, não sendo assim, as reclamações persistirão, mesmo com a tecnologia autorizada e à disposição.