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Líder no Watford, goleiro Gomes ainda pensa em defender a seleção brasileira

Luís Curro

“Nunca perdi a esperança. Estou muito bem e preparado se a oportunidade vier novamente. Foi e será sempre um orgulho vestir a camisa da seleção.”

As palavras, em entrevista a “O Mundo é uma Bola”, são de Heurelho da Silva Gomes, ou apenas Gomes, 34 anos, goleiro titular do Watford, clube promovido à elite do Campeonato Inglês (Premier League) para a disputa desta temporada.

Gomes, goleiro do Watford, da Inglaterra, exibe as luvas (BePro2)
Gomes, goleiro do Watford, da Inglaterra, exibe as luvas (BePro2)

A última vez que ele esteve com a seleção brasileira foi na Copa do Mundo de 2010, na África do Sul.

Era reserva de Júlio César no time que foi eliminado nas quartas de final ao perder de virada para a Holanda, por 2 a 1. O treinador de então era o mesmo de agora, Dunga. Não jogou um único minuto na Copa, mas considera aquela derrota o momento mais triste de sua carreira.

Gomes, em 2010, defendia o Tottenham, um dos grandes clubes de Londres.

Era titular desde a temporada 2008/2009 e vivia grande fase, tendo ajudado a equipe a terminar o Campeonato Inglês de 2009/2010 em quarto lugar, o que lhe deu uma vaga na Champions League.

Na temporada seguinte (2010-2011), porém, falhas em alguns jogos arranharam a credibilidade de Gomes.

A mais marcante delas ocorreu em partida das quartas de final da Champions, contra o Real Madrid. Em chute despretensioso de Cristiano Ronaldo, engoliu um frangaço.

Perdeu espaço, o treinador inglês Harry Redknapp o relegou à reserva. A situação não mudou com a chegada de um novo técnico, o português André Villas-Boas.

Jogou no futebol da Alemanha, por empréstimo, em 2013, e na volta à Inglaterra o cenário era o mesmo: a reserva do Tottenham – não era relacionado nem para ficar no banco.

Para Gomes, esses dois anos de Tottenham praticamente sem jogar foram os momentos mais difíceis de sua carreira, que sempre será lembrada pela Tríplice Coroa (títulos do Campeonato Brasileiro, da Copa do Brasil e do Campeonato Mineiro) conquistada com o Cruzeiro em 2003.

Sem perspectiva em Londres, Gomes tomou decidiu trocar um grande clube por um pequeno, para poder jogar. Contou que o Watford fez uma proposta e o queria para liderar a equipe, então na segunda divisão inglesa, à elite.

Ele aceitou o desafio, e saiu vitorioso: a equipe ficou em segundo lugar no campeonato de 2014/2015 e obteve o acesso.

O desafio agora é outro: tentar manter o Watford, clube da Grande Londres, na Premier League.

Por enquanto, passadas dez rodadas (são ao todo 38), o time está em 13º lugar, com 13 pontos (3 vitórias, 4 empates e 3 derrotas), e vai se salvando.

Gomes festeja gol do atacante Ighalo em Newcastle 1 x 2 Watford, pela Premier League (Andrew Yates - 19.set.2015/Reuters)
Festeja gol do atacante Ighalo em Newcastle 1 x 2 Watford, pela Premier League (Andrew Yates – 19.set.2015/Reuters)

Muito graças a Gomes. Com ele, o Watford ostenta a quinta melhor defesa da Premier League, com dez gols sofridos.

Melhores, apenas o Manchester City (líder), o Arsenal (vice-líder), o Manchester United (quarto colocado) e o Tottenham (sexto colocado) – todos levaram oito gols.

Confira a seguir a entrevista, na qual Gomes fala, entre outros temas, de seleção brasileira, de momentos de sua carreira, dos zagueiros que considera os melhores (no Brasil e no mundo), da sua habilidade em pegar pênaltis e do que planeja para o futuro.

Heurelho é um nome incomum. Sabe quem deu a ideia do nome, a origem e a razão?

Gomes: Nem meu pai sabia (risos). Pra falar a verdade, ele gostava do nome Aurélio, do dicionário, mas queria algo diferente, então escolheu esse, Heurelho, único no mundo, acredito. 

Quando e por que você decidiu ser goleiro?

Gomes: Foi em Sete Lagoas (Minas Gerais), em 1999. A prefeitura promoveu um campeonato de futebol de areia, e eu era o reserva como atacante. O goleiro titular quase nunca podia jogar, pois ele trabalhava, e foi quando pedi para jogar no gol. O resultado foi que nunca mais me deixaram sair do gol, pois fui considerado o melhor goleiro da competição. Terminamos o torneio em terceiro lugar entre 120 equipes.

Você é considerado um excelente pegador de pênaltis. Como se prepara para impedir gols em penalidades? Há algum segredo ou estratégia?

Gomes: A principal característica de um goleiro pegador de pênaltis é ser frio na hora das cobranças. Vejo vídeos um dia antes dos jogos dos possíveis batedores (do time rival), mas não me apego somente a isso, procuro na hora da cobrança esperar ao máximo o cobrador para ver onde irá colocar a bola, e daí uso toda minha envergadura. Às vezes não chego, mas normalmente vou no canto certo.

Houve uma fase em que você estava bem no Tottenham, depois perdeu espaço. O que aconteceu?

Gomes: Estava muito bem, nos classificamos para Liga dos Campeões, foi a única vez na história do clube, e chegamos às quartas de final. Perdemos o primeiro jogo para o Real Madrid, fora de casa, de 4 a 0, e no jogo de volta eu falhei no gol, e ganharam de 1 a 0. Quinze dias depois, contra o Chelsea, cometi uma falha, mas consegui me recuperar dela. Parei a bola em cima da linha, mas o árbitro deu o gol. O treinador Harry Redknapp já não gostava de mim e depois disso praticamente me deixou isolado no clube. Fiquei dois anos sem jogar no Campeonato Inglês, só jogava nas copas da Inglaterra e na Europa League.

Gomes, então no Tottenham, falha em chute de Cristiano Ronaldo, do Real Madrid, na Champions League (Javier Soriano - 13.abr.2011/AFP)
Então no Tottenham, falha em chute de Cristiano Ronaldo, do Real Madrid, na Champions League (Javier Soriano – 13.abr.2011/AFP)

Como foi a experiência de atuar na Alemanha, pelo Hoffenheim?

Gomes: Experiência fantástica. Apesar das condições do clube quando cheguei lá, estava em último no campeonato, foi uma ótima experiência. Cheguei em janeiro (de 2013), por empréstimo de cinco meses, na metade do campeonato, com a missão de ajudar o time a se manter na primeira divisão. O grupo estava desmotivado, e cheguei com o objetivo de ajudar o time não só dentro mas fora de campo. Deu certo, conseguimos nos manter na primeira divisão. O clube queria me contratar em definitivo, mas o Tottenham pediu um valor fora da realidade para eles.

Os atacantes alemães são mais frios na hora de concluir a gol que os de outros países?

Gomes: Não tem muita diferença dos que eu estava acostumado a enfrentar. Talvez a maneira de jogar das equipes seja diferente. Comparando com o futebol inglês, por exemplo, é um jogo mais técnico e cadenciado, parecido até com o nosso futebol.

O que o levou a defender o Watford, uma equipe não considerada de ponta no Reino Unido? Quais foram suas motivações?

Gomes: Foi o projeto e ambição do dono clube. Meu contrato, depois de seis anos no Tottenham, estava para acabar. O Tottenham me ofereceu mais dois anos de contrato para ser reserva do Lloris (francês), mas eu queria jogar. Conversando com o dono do Watford, ele me disse que precisava de mim para liderar uma equipe jovem. Um desafio diferente dos que eu estava acostumado, mas era uma oportunidade de continuar em Londres, onde minha família esta muito bem adaptada, já que o Watford fica na região metropolitana de Londres, e a oportunidade de voltar a jogar regularmente depois de dois anos deixado de lado no Tottenham. Aceitei o desafio e, graças a Deus, conseguimos nosso objetivo, subimos para primeira divisão.

Agarra bola em treinamento do Watford (BePro2)
Agarra bola em treinamento do Watford (BePro2)

Como você avalia seu desempenho pela equipe?

Gomes: Estou muito bem adaptado ao clube. Na temporada passada, fui considerado o segundo melhor jogador da temporada, ficando atrás do nosso atacante que fez 21 gols (Troy Deeney), assinei três anos de contrato e posso dizer que estou na melhor fase da minha carreira, me sentindo muito bem fisicamente e tecnicamente.

Você esteve pela última vez com a seleção brasileira na Copa do Mundo da África do Sul, quando o técnico era Dunga. Acredita ter chance de ser novamente convocado? Seleção é algo que você ainda almeja na carreira?

Gomes: Claro que tem outros goleiros na minha frente no momento, mas nunca perdi a esperança. O Dunga e o Taffarel (preparador de goleiros da seleção) me conhecem muito bem e sabem que podem contar comigo no momento que eles precisarem. Estou muito bem e preparado se a oportunidade vier novamente. Estou fazendo uma grande temporada junto com o Watford e jogando na melhor liga do mundo. Foi e será sempre um orgulho vestir a camisa da seleção.

Se você pudesse escolher dois jogadores de qualquer nacionalidade para ser a dupla de zaga a jogar à sua frente, quem seriam eles?

Gomes: Sergio Ramos (espanhol do Real Madrid) e Kompany (belga do Manchester City), pois acho que são bons tanto na bola aérea como em sair para o jogo. 

E se pudesse escolher uma dupla de brasileiros, qual seria?

Gomes: David Luiz (Paris Saint-Germain) e Luisão (Benfica), pois o Luisão é um líder, além de um grande zagueiro, e o David tem muita qualidade saindo para o jogo. É difícil, eu teria vários outros nomes, posso citar Juan (Internacional-RS) e Lúcio (Goa, da Índia), Alex (Milan) e Miranda (Inter de Milão), Gabriel Paulista (Arsenal) e Thiago Silva (Paris Saint-Germain). 

Quando pretende se aposentar? 

Gomes: Olha, se eu continuar me sentindo como me sinto atualmente, jogo mais uns cinco anos em alto nível tranquilamente. Me cuido muito na parte física e isso ajuda o resto. Não tenho uma data para parar de jogar. A partir do momento que eu achar que não posso mais render em alto nível, essa será a hora de parar.

Em treino do Cruzeiro, que faturou MIneiro, Copa do Brasil e Brasileiro em 2003 (Fernando Santos  - 23.set.2003/Folha Imagem)
Em treino do Cruzeiro, que faturou MIneiro, Copa do Brasil e Brasileiro em 2003 (Fernando Santos – 23.set.2003/Folha Imagem)

Voltará ao Brasil para encerrar a carreira?

Gomes: Nunca digo não em relação a uma volta ao Brasil, mas já tive mais vontade, principalmente na época que eu estava encostado no Tottenham. Hoje a vontade não é a mesma, joguei pouco no Brasil, são 11 anos fora. Mas, claro, se tiver a oportunidade novamente, seria maravilhoso. Nunca escondi a minha identificação com o Cruzeiro, então essa seria uma opção, mas os grandes de São Paulo e também os dois grandes do Sul seriam os times que eu jogaria tranquilamente.

Depois de pendurar as luvas, pretende seguir carreira no futebol?

Gomes: Ainda não sei em que área no futebol, mas com certeza vou tirar  um tempo longe do futebol e, depois, será onde continuarei. No próximo ano vou começar meu curso de treinador, quero me preparar antes, e depois me aperfeiçoar. Tenho muitos contatos tanto aqui na Europa quanto no Brasil.

Qual você considera o melhor momento em sua carreira de goleiro?

Gomes: Os quatro anos no PSV (da Holanda), onde ganhei quase tudo que disputei. Foram quatro anos de muitas conquistas pessoais, anos maravilhosos. 

E qual o pior momento?

Gomes: Os dois anos sem jogar no Tottenham, anos muito difíceis que Deus me ajudou a superar. Estava acostumado desde o Cruzeiro a jogar sempre, e esses dois anos foram como um choque. 

Qual foi a sua maior alegria no futebol?

Gomes: Duas: a Tríplice Coroa com o Cruzeiro e a convocação para Copa do Mundo.

Qual a maior tristeza?

Gomes: Ter perdido o Mundial em 2010.

E a maior mágoa?

Gomes: Mágoas nao tenho, Deus removeu isso do meu coração.

O goleiro faz pose em ensaio fotográfico (BePro2)
Faz pose em ensaio fotográfico (BePro2)

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