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Sortudo, Alisson erra duas vezes: ao frangar e ao não admitir que frangou

Luís Curro

Alisson disse que teve sorte devido ao ocorrido em Brasil 0 x 0 Equador, estreia da seleção de Dunga na Copa América Centenário, em Pasadena (EUA). Teve mesmo. Muita.

Em mais um jogo decepcionante do conjunto brasileiro, o arqueiro, que defenderá em breve a Roma após fazer sucesso no Internacional, escapou de ficar marcado por um erro grotesco, que poderia comprometer seu futuro na seleção.

Pois a opinião pública, quando se trata de futebol, e mais ainda quando se trata de goleiros, é bastante avessa a falhas.

Basta lembrar Barbosa, considerado o principal culpado pela derrota na final da Copa do Mundo de 1950, no Brasil, na partida conhecida como Maracanazo. O goleiro frangou em um chute de Ghiggia que rendeu ao Uruguai a vitória por 2 a 1, de virada.

Eis o momento que poderia ter se tornado fatídico para Alisson: aos 21 minutos do segundo tempo, o equatoriano Bolaños ganhou na corrida de Daniel Alves pela esquerda, dentro da grande área, chegou à linha de fundo e cruzou rasteiro.

Alisson se agachou para fazer a defesa, porém a bola, que pareceu ter pegado um certo efeito, resvalou na trave, bateu no braço esquerdo dele e parou na rede.

Um frangaço, um dos piores que já vi.

Alisson no momento em que levou um frango contra o Equador, no estádio Rose Bowl (Reprodução/Site oficial da Copa América)
Alisson no momento em que levou um frango contra o Equador, no Rose Bowl (Reprodução/Site oficial da Copa América)

A falha gritante de Alisson me fez lembrar imediatamente de dois lances.

O primeiro, um de Taffarel, que quando tinha 27 anos, em jogo na Bolívia pelas eliminatórias da Copa do Mundo dos EUA, cometeu uma falha parecida.

Etcheverry foi ao fundo, pela esquerda, e cruzou fraco (mas com mais força que o cruzamento de Bolaños). A bola bateu no pé esquerdo de Taffarel e entrou no gol. Um tremendo frango.

Era março de 1993, e o Brasil perdeu essa partida por 2 a 0, na primeira derrota da seleção em um confronto de eliminatórias de Copa do Mundo.

No ano seguinte, Taffarel, um dos melhores goleiros brasileiros da história, tornou-se um dos heróis da conquista do tetracampeonato ao defender um pênalti na disputa contra a Itália, após o 0 a 0 no tempo normal e na prorrogação.

No sábado (24), no mesmo Rose Bowl que consagrou Taffarel, hoje seu treinador de goleiros na seleção, Alisson escapou por pouco desse vexame. A razão: o gol foi anulado.

Só que, inacreditavelmente, ele não admitiu o erro, ao afirmar que “não tem bola fácil”.

Essa de fato não era fácil. Era facílima.

É preciso ser muito míope para não enxergar que foi um baita peru, e a relutância do goleiro em reconhecer isso, talvez uma ação para preservar sua imagem, chega a ser ridícula.

Alisson deve agradecer exclusivamente a um homem: o chileno Christian Schiemann, o responsável pela impuganação da jogada.

Schiemann era o auxiliar de arbitragem número 2 do jogo, e as câmeras mostram que, assim que Bolaños cruzou, ele ergueu a bandeira.

Só que as câmeras também mostram que a bola não saiu – a regra diz ser necessário que esteja completamente fora do campo para ser considerada fora de jogo, e isso não aconteceu.

Era, entretanto, um lance difícil para a arbitragem. O bandeirinha estava a uns 50 metros de distância. Errou por centímetros. Indesejável, mas perfeitamente perdoável.

O que é necessário analisar, independentemente de o gol não ter sido validado, é a falha de Alisson. Era uma defesa trivial, com nível zero de dificuldade.

Será muito importante considerar o quanto esse lance afetará psicologicamente o jogador de 23 anos. Espera-se que nada, pois um goleiro de seleção tem que ser emocionalmente inabalável. Será esse o caso de Alisson? Pois, se sua autoestima cair, não terá condição de continuar como titular.

E a comissão técnica da seleção, como reagirá a essa falha? Deve fazer vistas grossas, já que Alisson é há alguns meses o preferido de Dunga para a posição.

Já escrevi que não o considero a melhor opção para a seleção, e continuo a pensar assim. Já tinha falhado neste ano em um gol, de Suárez, em partida pelas eliminatórias da Copa da Rússia-2018.

Alisson não parece maduro, transmite um certo ar de insegurança.

Ele vinha treinando no Inter para jogar como líbero, e na seleção Dunga lhe tem dado aval para jogar adiantado – Neuer faz isso muito bem no Bayern de Munique e na seleção alemã.

Não me parece uma boa ideia jogar assim. Faltam-lhe, ao menos por ora, habilidade, controle de bola e capacidade de distribuição de jogo, tudo isso com os pés, para cumprir a função de líbero.

Com os treinos e a experiência, deve melhorar – pode aproveitar para pegar dicas valiosas com Rogério Ceni, auxiliar técnico de Dunga durante a Copa América. Hoje, porém, Alisson dá medo.

Voltando ao frango não validado diante do Equador, o segundo lance de que me lembrei ocorreu na Copa do Mundo de 2002, disputada na Coreia e no Japão.

Nas quartas de final, em Shizuoka, a Inglaterra abriu o placar contra o Brasil, no primeiro tempo, em erro clamoroso de Lúcio.

Heskey lançou do meio-campo na direção da entrada da área, e o beque brasileiro não dominou ao tentar cortar. A bola tocou em sua coxa e sobrou para Owen, que chutou e superou Marcos.

Se o jogo terminasse 1 a 0, com o Brasil eliminado, provavelmente seria o fim da linha para Lúcio na seleção. Felizmente para ele, Rivaldo empatou, ainda no primeiro tempo, e Ronaldinho Gaúcho virou, na segunda etapa.

O Brasil se classificou, passou por Turquia e Alemanha e se sagrou pentacampeão mundial.

O erro de Lúcio foi perdoado, e ele disputou mais duas Copas como titular: Alemanha-2006 e África do Sul-2010, nesta última como capitão.

Desta vez, Alisson não precisará de perdão. Mas é bom não abusar da sorte.

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